A reflexão,
sem dúvida, é a maior arma do consumidor para evitar as compras por impulso, o
que invariavelmente acaba levando ao superendividamento. De outro lado, maus fornecedores
fazem de tudo para que o consumidor não pense. Dizem que aquele produto por
aquele preço só estará disponível naquele exato momento e que, se o consumidor
pensar, deixará passar aquele negócio imperdível. As ofertas, em geral, lidam
com o aspecto psicológico do consumidor para induzi-lo ao consumo, muitas vezes
desnecessário. A nossa própria sociedade de massa conspira para o consumismo,
porque valora as pessoas de acordo com seus bens e não conforme seu caráter.
Não existem
negócios imperdíveis! Existem negócios melhores e piores, dependendo da margem
de lucro praticada pelo fornecedor seguindo regras de mercado da oferta e
demanda. Consumidor que compra produtos e serviços em época de maior demanda
pagará mais caro. Consumidor que compra produtos e serviços mais requisitados
pagará mais caro. Mesmo fazendo um bom negócio, o que significa que pagou o
mínimo possível, estará preservada a margem de lucro do fornecedor. A reflexão,
qualquer que seja a oferta, é o melhor caminho a seguir e a forma de prevenir
problemas.
A Lei n°
8.078?90 só confere ao consumidor o direito
de arrepender-se das compras realizadas fora do estabelecimento comercial, como
por exemplo por internet, telefone, reembolso postal, etc.. Esse tratamento
diferenciado é conferido pela lei para
preservar o direito do consumidor à reflexão, mitigado por ofertas mais
agressivas que são aquelas que acabam surpreendendo o consumidor nos seus
afazeres diários, nos seus momentos de descanso ou lazer.
Consumidor
que está em casa fazendo comida e recebe uma ligação telefônica, ou um vendedor
na porta, oferecendo produto ou serviço, por vezes acaba comprando porque é
surpreendido pela oferta e não reflete. Da mesma forma, quem está no computador
trabalhando e recebe na tela uma janela de um produto acaba, por vezes,
comprando algo desnecessário. A agressividade desse tipo de oferta justifica a
proteção extra do consumidor, assim como também a impossibilidade de manuseio
do produto adquirido a distância.
Como essas
ofertas a distância reduzem custos, porque a loja virtual custa bem menos do
que a loja física, ampliam o mercado e incrementam as vendas, natural que os
fornecedores que as praticam arquem com todas as despesas geradas pela
desistência do negócio por parte do consumidor.
Justamente
por isso o art. 49, "caput" do Código de Defesa do Consumidor assegura o
direito de arrependimento no prazo de sete dias, contados do efetivo
recebimento do produto ou da contratação do serviço. Seu parágrafo
único, por sua vez, carreia ao fornecedor todos os custos decorrentes do
desfazimento do negócio pelo consumidor nesse prazo.
Embora a lei
seja clara e prescinda de maiores interpretações, na prática o exercício do
direito de arrependimento por parte do consumidor apresenta inúmeras
dificuldades. Falta informação para os consumidores nesse sentido e alguns
fornecedores também dificultam seu exercício até que o prazo decorra e o
direito desapareça. O ônus de manifestar tempestivamente o desejo de
arrepender-se é do consumidor, que, por isso, deve fazê-lo sempre por escrito,
mediante protocolo, notificação, carta com AR, etc..
A partir da
manifestação inequívoca do arrependimento todas as providências de reversão do
negócio cabem ao fornecedor, que deverá devolver todos os valores pagos pelo
consumidor, monetariamente corrigidos, e retirar o produto no endereço da
entrega. É direito do consumidor obter um documento do fornecedor confirmando o
desfazimento do negócio, bem como estabelecendo a forma e condições da
devolução dos pagamentos. Esse documento básico de informação, na prática, não
é fornecido.
Tratando-se
de pagamento em dinheiro ou por boleto bancário, a devolução do preço
monetariamente corrigido deve ser imediata. Quando o pagamento for realizado
através de cartão de crédito, deverá o fornecedor comunicar imediatamente a
administradora do cartão, a fim que não lance ou mesmo estorne o valor,
cancelando a cobrança caso já tenha sido realizada. Na pior das hipóteses, no
entanto, a devolução deverá ocorrer na forma do crédito correspondente,
monetariamente corrigido, na fatura seguinte.
Na prática,
os valores demoram duas ou três faturas para serem devolvidos e sem a correção
monetária assegurada pela lei. Enquanto isso o consumidor fica sem seu
dinheiro, de forma absolutamente ilegal e, muitas vezes, sem a possibilidade de
comprar outro produto porque seu dinheiro está retido. Trata-se de prática
abusiva que está a merecer maior atenção dos órgãos de defesa do consumidor.
A retirada
do produto, após o exercício do direito de arrependimento, acaba sendo um outro
problema. Alguns fornecedores exigem que o consumidor retorne o produto ao seu
estabelecimento, pessoalmente ou através de postagem, arcando com os custos. A
obrigação de retirada é do fornecedor e todos os custos do cancelamento do
negócio igualmente são seus.
A
importância do direito de arrependimento é maior nas compras pela internet, que
vêm cada vez mais aumentando. Justamente por isso, o Decreto 7962, de 15 de
março de 2013, tem como um de seus princípios o respeito ao direito de
arrependimento. Dentre as regras estabelecidas pelo decreto está o dever de
informação dos consumidores, de forma clara e ostensiva, a respeito das
condições e dos canais disponíveis para o exercício do arrependimento, que
devem ser, no mínimo, aqueles também utilizados para as vendas.
Quem compra
na loja física não tem direito de se arrepender, mas se a loja é transportada
para um local de grande fluxo de consumidores, como por exemplo barraca de
venda no metrô, restará preservado o direito de arrependimento. Consumidor que
exagerou na compra na loja física deve honrar os pagamentos e não tem direito
de devolver o produto ou serviço adquirido. No caso de serviços ainda não
prestados, a desistência será possível mediante o pagamento de uma multa apta a
compensar o fornecedor em relação aos seus custos administrativos.
Multas
referentes a serviços não prestados cancelados com bastante antecedência, em
regra, não podem ser superiores a dez por cento do preço pago. A multa poderá
ser ainda menor caso o fornecedor consiga vender aquele mesmo serviço para
outro consumidor nas mesmas condições, o que significa a absoluta falta de
prejuízo em relação àquele serviço cancelado.
A maior arma
do consumidor para prevenir problemas continua sendo a reflexão. Mesmo naqueles
casos em que o arrependimento é assegurado pela lei, os percalços são muitos, e
o consumidor acaba perdendo bastante tempo para desfazer o negócio. Na dúvida o
consumidor não compra, para poder refletir melhor. Na grande maioria dos casos,
após a reflexão, o consumidor deixará de comprar por reputar aquela compra
desnecessária.
Por Arthur Rollo