No mês da mulher, compartilhamos
histórias de mulheres que abriram negócios com um propósito: segurar na mão da
outra
1 -
Nenhum direito a menos
Sozinha ando bem, mas contigo ando melhor. Essa é a
frase que inspira o trabalho da advogada Gabriela Ribeiro de Souza, 32
anos. Embora trabalhe no ramo há 9 anos, ela criou em 2017 o
primeiro escritório totalmente voltado para mulheres. "Sabemos que muitas
mulheres vieram antes da gente e respeitamos muito todas elas, mas não existia
um escritório focado para atender todas as áreas. Não somos especialistas em
tudo, mas fazemos parcerias com advogadas de diversas especialidades", conta Gabriela.
A motivação para abrir o escritório foi por entender que o direito ainda é
diferente para as mulheres e para os homens. "As mulheres precisam de um
atendimento diferenciado porque passam por situações diferenciadas. O direito
nos foi negado por muito tempo. Não só o direito processual, como também os
nossos direitos; a gente teve que lutar por eles. Então, precisamos ter uma
visão diferenciada do que é o direito para um homem e do que é o direito para
uma mulher. "
Ao longo dos dois anos de atuação, o escritório de
Gabriela já trabalhou com mais de 20 advogadas parceiras e atendeu cerca de 500
clientes. Além disso, nas redes sociais, a página conta com mais de 20 mil
seguidores. Por lá, a advogada publica conteúdos informativos sobre Direito.
"Esse escritório existe porque acredito que o conhecimento jurídico
empodera. A porta da nossa sala de espera está sempre aberta. De vez em quando,
as mulheres vêm, sentam um pouquinho, esperam e depois conversam com a gente. Virou
um referencial", conta.
A atuação como advogada feminista é, como define
Gabriela, mexer em um vespeiro. "O judiciário é muito machista, os colegas
advogados são muito machistas, então é muito difícil estar sozinha. " Para
ajudar outras advogadas a abrirem os seus próprios escritórios, Gabriela criou
um manual que explica os trâmites para abrir um escritório e está sempre aberta
para dialogar com as colegas que desejam atuar na causa. Isso porque ela
acredita que olhar para mulheres dessa maneira é um agente prático de mudança.
"Como advogada feminista, me vejo como uma agente da transformação social.
Provoco o judiciário com questões que não estavam em pauta. " Ela ainda dá uma
dica para as advogadas que estão ingressando nesse segmento. "Não é um nicho de
mercado. Se você vai fazer advocacia feminista para ganhar dinheiro, nem
entra. Tem que ter identificação com a causa, senão você não consegue. Em
compensação, eu nunca fui tão feliz no exercício da profissão. Às vezes, não
consigo acreditar que consegui fazer da minha luta diária o meu projeto de vida
profissional. É muito gratificante. "
2 -
Educação financeira é para todas
Foi ao perceber que as mulheres não conversavam
sobre dinheiro que a jornalista Leila Ghiorzi, 31, decidiu criar o
projeto É Da Minha
Conta. "Em 2014, fui morar no Rio de Janeiro e passei pelo processo
de sair da casa dos meus pais. Comecei a conversar mais sobre isso, pedir dicas
de como organizar financeiramente e comecei a ver a necessidade das pessoas de
conversar sobre esse assunto", conta Leila, que procurou um curso de coaching
financeiro para se especializar. Foi então que ela começou a desenhar o projeto
voltado para mulheres. "Tenho um envolvimento com o feminismo e percebi que as
mulheres não conversam sobre dinheiro como os homens conversam. A gente não é
estimulada a conversar sobre isso."
O projeto possui o formato de atendimento
premium, em que a coaching acompanha a cliente durante cinco meses.
"Começamos desde organização básica até o que se deseja fazer com o dinheiro,
desde esclarecer prioridades, falar sobre orçamento, investimentos. " Além
desse formato, Leila atende pontualmente clientes que desejam investir e dá
palestras e cursos. Ela conta que muitas mulheres a procuram por ter
vergonha de tratar desse assunto em frente aos homens. Durante os cinco anos de
atuação, a maior dificuldade de atuar no meio financeiro é, segundo ela,
convencer os homens de que a ideia do projeto não é prejudicá-los. "Quando falo
sobre isso com mulheres, elas falam que é necessário. Já os homens questionam
por que o projeto é só para mulheres. Acredito que, na verdade, esses
espaços só com mulheres precisam existir para que a gente se fortaleça.
Precisam existir até que não sejam mais necessários. Mas, nesse momento, eles são.
"
3 - 30
anos de luta pelo futebol feminino
Duda dispensa apresentações. Há mais de 30 anos no
futebol, ela sempre manteve espaço aberto para as meninas que desejam ingressar
no esporte. O interesse por ser uma atleta nasceu junto com a paixão pelo
Inter. "Eu era vizinha do Valdomiro, craque do Inter na década de 70, e foi ali
que nasceu minha paixão pelo Inter. Com 13 anos, vi um anúncio no jornal e fui
fazer uma seleção no clube. Na época, não tinha categoria de base. Então, com
14 anos joguei meu primeiro campeonato brasileiro", conta Duda, que atuou
por oito anos na Seleção Brasileira e também na Itália, no Milan e no
Verona.
A Escola da Duda, hoje com 28 anos, é uma das mais tradicionais
do Estado. No início, o projeto era só para meninas; hoje também é aberta para
meninos, que somam 80% do público da escola. Há três anos, Duda faz parte do
projeto de retomada do futebol feminino no Inter. Como coordenadora técnica,
ela conta que este ano o time está na elite do futebol. "O Inter, esse ano, tem
um time profissional, com vínculo na CBF, com atletas com carteira assinada. É
o terceiro ano do futebol feminino no clube e estamos na Série A, junto com a
elite do futebol no País."
Comparando o tempo que começou no futebol com o
presente, é possível ver muitas diferenças, segundo Duda. "A gente sempre quis
torcida, e hoje temos mais de 8 milhões de torcedores nos acompanhando. Sempre
desejamos calendário e hoje a CBF tem um só para o futebol feminino. Queríamos
clubes fortes, e hoje isso está crescendo." No entanto, apesar de mudanças
significativas, ainda existem muitas dificuldades. "Falta a federação gaúcha
apoiar um um pouco mais, principalmente as categorias de base.
Também precisamos de mais apoio da mídia porque a
partir do momento que tiver visibilidade vamos ter patrocínio e menos
dificuldade de divulgar os nossos resultados." Para as atletas que estão
começando, a dica é persistência. "A palavra desistir não existe no meu
vocabulário. Amo o que eu faço e hoje a gente está no lugar certo, no momento
certo e o futebol feminino vai ser 'o' esporte."
4
- Camisetas para mandar o recado
A Bêrga Tees se propõe a trazer mais personalidade para os
looks do dia. Comandada pela estudante de publicidade Júlia Bertaso Barbieri,
19, e pela psicóloga Paula Fernandes Aiquel, 27, a marca nasceu durante a Copa
do Mundo de 2018. "Começamos na Copa porque as pessoas queriam se envolver com
o evento, mas não queriam gastar muito. Então criamos camisetas com frases
engraçadas para ser uma opção mais barata para torcer", conta Júlia. No término
do evento, a marca decidiu apostar em camisetas feministas, tema que as sócias
se identificam. "Tem várias marcas que fazem camisetas feministas, então uma
forma que a gente achou de trazer isso de uma maneira diferente foi trazer
frases de filmes e séries. É uma forma leve de trabalhar o tema."
A camiseta mais vendida nos primeiros nove meses de
marca leva a frase "Empieza el Matriarcado", dita pela personagem
Náirobi, da série La Casa de Papel. Júlia acredita que o diferencial é
trabalhar com algo que elas realmente se identificam. "Sempre quis empreender,
mas não gosto de criar uma coisa que eu não vejo um significado maior. Não
queria vender por vender. Colocar essas questões nas nossas camisetas é uma
forma das pessoas se envolverem também. As clientes falam com a gente como
se fossemos amigas. Elas sabem que são mulheres por trás da marca e a questão
da representatividade é muito importante."
5 -
Reconfortar mulheres através da arte
Com mais de 160 mil seguidores no Instagram, a
página Isadora Não Entende Nada é comandada pela Isadora Laís
Brandelli, de 27 anos, que diariamente publica ilustrações e poemas sobre o
universo feminino. Em 2012, a artista sentiu necessidade de criar um espaço
para publicar seus textos e desenhos. "Eu já desenhava e escrevia bastante e
alguns amigos sempre falavam pra eu criar uma página minha. Mas não tinha nome
e não queria que fosse apenas o meu. Um dia eu peguei um livro de contos do
Eduardo Galeano chamado Mulheres e abri aleatoriamente. O conto da página em
que abri se chamava Isadora, sobre a Isadora Duncan. A primeira frase que
eu li foi 'Isadora não entende nada'. Na hora me pareceu o nome perfeito pra
essa mistura de arte e poesia que eu fazia e não sabia nada", diverte-se
Isadora.
Com um grande alcance nas redes sociais, Isadora
conta que é gratificante saber que o seu trabalho consegue confortar outras
mulheres. "Me deixa feliz e realizada que os meus sentimentos colocados no
papel em forma de poesia, texto e ilustração consigam dar apoio e
conforto. As temáticas tem muito a ver comigo, dificuldades que eu passei
com a minha saúde mental e emocional, e eu sei o quanto é difícil viver fases
assim." Com dois livros publicados de maneira independente, a artista também
comercializa na sua loja on-line prints de seus desenhos e camisetas com
estampas criadas por ela.
Em seus desenhos, ela representa diferentes
mulheres, com diversos corpos, cabelos, cor de pele. "Como mulher, fui ensinada
que as outras são minhas inimigas, que corpos diferentes são feios e que só o
padrão importa. Mesmo não seguindo o padrão, por muito tempo a gente continua
achando estranho o corpo que destoa da capa da revista. Minhas ilustrações são
feitas com base em fotos e é nessa procura que eu vejo como somos muitas -
apesar de ser bem mais difícil encontrar referências de mulheres fora do
padrão. Tive que aprender a desenhar outros corpos, outras cores, outros rostos
e isso é sempre um desafio. Tento realmente preservar essas diferenças e
mostrar que existem muitos tipos de belezas." Para Isadora, o sentido do seu
trabalho enquanto artista é conseguir reconfortar outras mulheres. "Se a
mensagem que eu passo trouxer um mínimo de alívio e força para uma pessoa que
seja, o meu trabalho já ganha todo sentido do mundo pra mim."
6 -
Bordado como rede de apoio
Criado em 2016, o Bordado
Empoderado foi fundado pela artista têxtil e fotógrafa Bruna
Antunes para ressignificar o bordado, mostrando a técnica em um novo formato,
mais atual e feminista. Com mais de mil alunas ao longo de três anos, o projeto
consiste em oficinas que ensinam diversos tipos de bordado. Para Bruna, um dos
legados do projeto é criar redes de apoio entre as mulheres que frequentam as
suas aulas. "Mulheres unidas por algumas horas formam rede, trocam ideias,
sentem-se encorajadas a buscar seus sonhos e objetivos. Meu trabalho, muito
mais do que ensinar a técnica do bordado livre, se orienta pela vontade de
juntar mulheres de realidades diversas por algumas horas. Esses momentos -
oficinas, encontros, rodas de bordado, imersões - são catalisadores de
parcerias e promovem a valorização da economia criativa e o despertar de uma
consciência sobre o consumo."
7 -
Chás com mensagens inspiradoras
Criado há um ano, em São Paulo, pelas irmãs Laís e
Nara Trajano, o The Feminist Teajá vendeu 10 mil packs de chás inspiradores e
reúne mais de 40 mil seguidores no Instagram. Os chás levam mais de 600
mensagens de empoderamento feminino, com frases de mulheres famosas como Lady
Gaga, Michelle Obama, Clarice Lispector. Além disso, o produto também tem
mensagens inspiradas em frases populares, como "Não é Não" e
"the future is female". Todos os blends de ervas têm nome de
mulheres. O chá Simone, que homenageia Simone De Beauvoir, é uma
mistura de hortelã, camomila, alecrim, maracujá, sálvia, salsa e canela, que,
segundo as sócias, ajuda a relaxar, dormir melhor e lidar com stress. O chá que
faz referencia a Eleonor Roosevelt leva Carqueja, orégano chileno, camomila,
maçã e hibisco. Priorizando ervas orgânicas e ingredientes naturais, os
produtos são vendidos em sacolinhas de tecido que contém 15 sachês pelo preço
de R$ 29,90 no site da marca.
8 -
Mais espaço para o empreendedorismo feminino
A proposta da Manas Loja e
Espaço Coletivo é dar mais espaço para o empreendedorismo
feminino. Criada em 2018 pelas sócias Carolina Cozzatti e Juliana
Nogueira, o espaço colaborativo reúne o trabalho de 34
empreendedoras, sendo 90% delas mães. Esse é um aspecto muito importante para
as sócias que se conheceram justamente em função da maternidade. Apesar de ter
muitos produtos infantis, o Manas tem itens também para as mulheres. "Tem
muitos lugares parecidos com o nosso, mas voltados somente para a criança.
Aqui, a atenção é voltada para a mãe, para a mulher", conta Carolina. O espaço,
que ainda não completou um ano, tem como meta seguir crescendo junto com todas
as mulheres que estão ali: sócias, empreendedoras e clientes. "É um pouco
pensando em nós, em como foi importante termos umas às outras nesse momento de
pós-parto. E acreditamos naquela frase de que para criar uma criança é preciso
uma aldeia. Então, a gente precisa de muitas mãos dadas e muito apoio",
afirma Carolina.
Fonte: Jornal do Comércio RS