Institucional Consultoria Eletrônica

O resgate da inocência


Publicada em 29/10/2019 às 09:00h 

 "Crianças, ao contrário dos adultos, sabem aproveitar o presente."(Jean de la Bruyère)

Tive o prazer de desfrutar de uma experiência singular: a primeira apresentação de balé de minha filha de quatro anos.

O evento, idealizado e organizado com carinho e competência por Patricia Famá, reuniu mais de 50 alunos de sua escola distribuídos em quatorze performances temáticas. Mas um detalhe em especial levou-me a uma reflexão que gostaria de compartilhar: a diferença entre as apresentações infantis e juvenis.

As exibições das crianças, com faixa etária de quatro a doze anos, mas notadamente daquelas com até sete ou oito anos de idade, foram marcadas por características similares. As pequenas bailarinas entravam no palco com um sorriso contagiante no rosto. Reunidas em grupos de três a sete participantes, era comum observá-las se entreolhando, perguntando umas às outras sobre o enredo esquecido, e buscando guarida na professora, que escondida por detrás da cortina, estava sempre a postos para caprichosamente orientá-las.

Durante o espetáculo, era possível notar o desenvolvimento da técnica e o aprendizado pelo qual cada aluna passou. Entretanto, em virtude da tenra idade, era natural que não houvesse uma sincronia nos movimentos. Para os convidados, isso pouco importava. Claro que ali estavam pais, mães, irmãos e avós prontos para aplaudir a qualquer cena. Mas o fato primordial era a alegria daquelas crianças por estarem ali maquiadas, vestidas com um figurino especial, entre amigas e diante de seus familiares.

Já as exibições dos adolescentes tinham outras nuances. A preocupação primordial era a técnica, a obediência à coreografia, a perfeita sincronia. Era perceptível o preparo, o treinamento, a entrega daqueles jovens. Analogamente, a plateia também assistia com outros olhos, pois o que presenciava eram futuros profissionais da dança.

Todavia, aquele sorriso espontâneo, eventualmente até permeado por um diálogo aberto entre duas pequenas amigas em pleno palco, era substituído por feições mais contidas nos adolescentes. Certamente havia alegria em seus corações, porém os semblantes transmitiam, sobretudo, responsabilidade e até mesmo a dor física do esforço da dança.

Entre as crianças, um erro na coreografia era imediatamente acolhido pelas demais que procuravam ajudar à colega. E o público se divertia, sentindo a leveza daquele tratamento, como que aprendendo uma nova maneira de lidar com as vicissitudes, dando-lhes importância na medida exata de sua adequação. Já entre os adolescentes, um equívoco era recebido com olhar de censura ou pedido de atenção. E novamente o público se identificava, possivelmente reconhecendo ali um padrão de comportamento adotado nos palcos da vida.

Isso nos faz refletir sobre como a vida adulta se torna chata na medida em que nossas pernas crescem. Compromissos, deveres e responsabilidades depositam tamanha carga sobre nossos ombros que substituímos a espontaneidade pela artificialidade, a emoção pela razão, o prazer pela obrigação.

Precisamos resgatar, com brevidade, um pouco da inocência perdida, inspirando-nos na pureza das crianças.

Por Tom Coelho






Sobre o(a) colunista:



Tom Coelho é autor de “Sete Vidas – Lições para construir seu equilíbrio pessoal e profissional”, pela Editora Saraiva, além de consultor, professor universitário e palestrante. Com formação em Publicidade pela ESPM, Economia pela FEA/USP, especialização em Marketing pela Madia Marketing School e em Qualidade de Vida no Trabalho pela USP, é mestrando em Gestão Integrada em Saúde do Trabalho e Meio Ambiente pelo Senac. Diretor da Lyrix Desenvolvimento Humano, Diretor Estadual do NJE/Ciesp e VP de Negócios da AAPSA. Contatos através do e-mail tomcoelho@tomcoelho.com.br.



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