Apesar de os jornais noticiarem que o
Brasil reduziu as taxas de juros para o menor nível histórico, na prática, o
crédito destinado à pessoa jurídica diminui mais lentamente e continua elevado.
Tradicionalmente, os juros sempre foram
elevados no Brasil. Mesmo que eventualmente oscilando para baixo, os
percentuais tendiam a retomar o movimento de alta. Esse padrão começou a mudar
de forma mais consistente, em outubro de 2016, quando a taxa básica de juros
foi rebaixada de 14,25% ao ano (a.a.) para 14% a.a. A partir daí, a
desaceleração tem sido contínua e chegou ao menor nível da história em setembro
de 2019, alcançando 5,5% a.a. Entretanto, essa informação não condiz com a
realidade que o empresário encontra ao buscar linhas de crédito junto aos
bancos, embora as perspectivas sejam positivas.
A taxa básica de juros representa as
condições negociadas no âmbito do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia
(Selic). "É a taxa de transação firmada entre bancos com o Banco Central",
esclarece o economista e membro do Centro de Estudos de Conjuntura e Política
Econômica (Cecon), Felipe Da Roz.
Definida durante as reuniões do Comitê de
Política Monetária (Copom), a taxa Selic é, em certa medida, repassada para as
linhas de crédito de mercado que chegam às pessoas físicas e jurídicas, explica
Da Roz. "Quando a taxa está subindo, o ajuste por parte dos bancos é, praticamente,
automático. Quando está caindo, porém, os bancos não repassam tudo".
De acordo com a pesquisa de juros,
realizada mensalmente pela Associação Nacional dos Executivos de Finanças,
Administração e Contabilidade (Anefac), é possível observar a retração das
taxas aplicadas às linhas de crédito à pessoa jurídica. Em setembro de 2019, a
taxa média estava em 47,64% a.a., contra 54,29% a.a. na comparação com o mesmo
mês de 2018. "Com a queda da Selic, os juros, de maneira geral, têm caído,
ainda que não acentuadamente como se espera. O que significa que ainda há
espaço para reduzir mais os juros praticados no mercado", avalia o
diretor-executivo de economia da Anefac, Roberto Vertamatti.
Momento para rever dívidas
O movimento de retração da taxa Selic
favorece as empresas. Uma das vantagens é que os percentuais aplicados às
operações de crédito começam a regredir gradualmente. Outro benefício diz
respeito à renegociação das dívidas. Da Roz ressalta que organizações que, no
passado, assumiram dívidas com juros nominais maiores podem procurar as
instituições bancárias para rever as taxas cobradas.
"Conseguindo renegociar a taxa hoje, os
preços serão ajustados e a taxa de juros ficará travada", assegura o
economista. Isso quer dizer que, caso a Selic volte a subir, o empresário ainda
contará com condição melhor para o pagamento das dívidas. Vertamatti acrescenta
que, concomitantemente, a companhia deve estabelecer uma revisão de custos com
vistas a otimizar a gestão financeira do negócio.
Por que o crédito continua caro?
A prática do mercado de crédito para pessoa
jurídica ainda não está alinhada à trajetória de redução da taxa básica de
juros. A Anefac demonstra esse descolamento comparando os percentuais de março
de 2013 com os de setembro de 2019. Nesse período, enquanto a Selic regrediu
1,75 ponto percentual, baixando de 7,25% para 5,5% a.a., o mercado elevou as
taxas em 4,06 pontos percentuais, com incremento de 43,58% a.a. (março de 2013)
para 47,64% a.a. (setembro de 2019).
Sobre os fatores que contribuem para esse
afastamento, Vertamatti enumera cinco pontos.
1. Baixa concorrência no sistema
bancário
No Brasil, cinco grandes bancos dominam 85%
do mercado bancário. Equilibrar a concorrência poderia beneficiar os clientes.
2. Alta carga tributária
O peso dos tributos também impacta o
sistema bancário, refletindo diretamente nos juros cobrados.
3. Inadimplência
A inadimplência dos clientes contribui para
que as taxas de juros permaneçam elevadas. "No caso de pessoas físicas, que
acabam afetando indiretamente as empresas, a implantação do cadastro positivo
irá facilitar gradativamente a redução da inadimplência", projeta.
4. Burocracia
Outro fator que impacta o custo do crédito
é a burocracia brasileira, que afeta tanto empresas quanto pessoas físicas.
5. Falta de competitividade
Há,
também, poucas alternativas no tocante às linhas de longo prazo. Essa falta de
competitividade "engessa a economia brasileira como um todo", avalia.
Fonte: Contas em
Revista
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