Lojas dedicadas ao comércio varejista em
geral não podem, na venda por crediário, estipular juros remuneratórios
superiores a 1% ao mês, ou 12% ao ano. Por não se equipararem a instituições
financeiras e não estarem sujeitos à fiscalização e à regulação do Conselho
Monetário Nacional (CMN), esses estabelecimentos devem respeitar o limite
fixado pelo Código Civil nos artigos 406 e 591.
Com esse entendimento, a Terceira Turma,
durante a primeira sessão por videoconferência
da história do Superior Tribunal de Justiça (STJ), realizada terça-feira
(28/4/2020), negou provimento a um recurso das Lojas Cem e manteve decisão que
considerou ilegal a cobrança de juros remuneratórios superiores a 1% ao mês nas
vendas pelo crediário.
"Por não ser instituição financeira, a
recorrente não se encontra submetida ao controle, à fiscalização e às políticas
de concessão de crédito definidas pelo referido órgão superior do Sistema
Financeiro Nacional [CMN] e não pode firmar contratos bancários, como o de
financiamento, contratando juros pelas taxas médias de mercado", comentou
a ministra Nancy Andrighi, relatora do caso.
O consumidor, que comprou uma câmera
fotográfica em seis parcelas, questionou na Justiça a incidência de juros
abusivos na operação. A sentença julgou a ação procedente, retirou do contrato
a cobrança de juros capitalizados e limitou a taxa dos juros remuneratórios a
1% ao mês.
O acórdão do Tribunal de Justiça de Minas
Gerais (MG) manteve a sentença, destacando que empresas que não pertencem ao
sistema financeiro, ao conceder financiamento aos consumidores, devem observar
as regras da Lei de Usura (Decreto 22.626/1933) e do Código Civil ao
estipular os juros remuneratórios.
Cobrança
excepcional
No recurso especial, as Lojas Cem
defenderam a tese de que seria permitida às empresas varejistas a cobrança de
juros remuneratórios acima do patamar do Código Civil, observado o limite da
média do mercado. A empresa citou violação do artigo 2º da Lei 6.463/1977.
Segundo a ministra Nancy Andrighi, a
cobrança de juros remuneratórios superiores aos limites estabelecidos pelo
Código Civil é excepcional e deve ser interpretada restritivamente, cabendo
avaliar se a relação jurídica se encontra submetida a uma legislação especial
ou à regra geral do código.
"Excetuadas apenas as situações
submetidas às leis específicas do crédito rural, habitacional, industrial e
comercial, somente as relações jurídicas constituídas no primeiro campo
[relações obrigacionais firmadas com instituições financeiras, isto é, em que
ao menos uma das partes seja integrante do Sistema Financeiro Nacional], por
serem regidas pela Lei 4.595/1964, não se sujeitam aos limites da taxa de juros
moratórios e remuneratórios inscritos no atual Código Civil, conforme
entendimento consolidado na Súmula 596/STF",
explicou.
Lei antiquada
Sobre a violação da Lei 6.463/1977, a
ministra disse que, embora o projeto legislativo que lhe deu origem tenha sido
apresentado em 1963 como uma complementação da Lei de Usura, ele somente virou
lei em 1977, quando, conforme manifestação da Associação Comercial de São
Paulo, já estava completamente desatualizado devido às mudanças no mercado
varejista.
Nancy Andrighi destacou que a aprovação do
projeto ocorreu após a vigência da lei que dispõe sobre a política monetária
nacional e dá competência ao CMN para regulamentar o crédito em todas as suas
modalidades - Lei 4.595/1964.
"Dessa forma, a previsão do artigo 2º
da Lei 6.463/1977 faz referência a um sistema obsoleto, ultrapassado, em que a
aquisição de mercadorias a prestação pelos consumidores dependia da atuação do
varejista no papel de instituição financeira e no qual o controle dos juros
estava sujeito ao escrutínio dos próprios consumidores e à fiscalização do
Ministério da Fazenda", declarou.
A ministra concluiu afirmando que, como a
Lei 6.463/1977 - nos termos da jurisprudência da Terceira Turma - é norma de
ordem pública e não deve ser interpretada de forma extensiva, os varejistas não
podem ser equiparados às instituições financeiras e, consequentemente, não
estão autorizados a cobrar encargos cuja exigibilidade a elas é restrita.
Leia o voto da relatora.
Fonte:
STJ, referente ao processo: REsp 1720656
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