Igreja
pode ser responsabilizada por possíveis vazamentos de dados dos membros
Foi publicada em 2018 a
Lei Geral de Proteção de Dados, também conhecida como LGPD, que tem por
objetivo principal a proteção dos direitos fundamentais de liberdade e
privacidade de todos. Ou seja, de garantir proteção adequada contra violações
de privacidade, bem como assegurar a transparência no uso dos dados em
quaisquer meios. A Lei 13.709/18 é aplicada onde os dados encontram-se
coletados, ou seja, a lei não está restrita ao mundo virtual, mas também com os
dados mantidos em meios físicos (livros, fichas, etc.). Portanto, uma Igreja
pode ser responsabilizada por possíveis vazamentos de dados dos membros ou
visitantes. Ou seja, nada impede que os responsáveis sejam enquadrados nesta
lei, que possui punições significativas.
Como as igrejas costumam
coletar diversas informações pessoais em seus cadastros de membros, informações
financeiras e em alguns casos informações confidenciais de foro íntimo através
de confissões, existem grandes chances desta lei via a ser invocada em um
possível litígio.
A lei já começou a vigorar
em setembro/2020, embora as possíveis sansões só sejam aplicadas a partir de 1º
de agosto de 2021. Portanto, estamos diante de uma mudança significativa na
relação e cuidado com os dados pessoais, inclusive dos membros das Igrejas.
Destaca-se
que a lei determina que todos dados pessoais (informação relacionada à pessoa
natural identificada ou identificável, como nome, idade, endereço, e-mail,
estado civil, número de documentos, situação patrimonial, etc.) só podem ser
coletados por qualquer tipo de suporte (papel, eletrônico, som e imagem, etc.)
mediante o consentimento do usuário, o devido esclarecimento sobre a finalidade
de solicitar aquela informação e o tempo em que o dado será tratado até o seu
descarte. Neste sentido, é interessante nos formulários (em papel ou
eletrônicos) ter um espaço para o "aceite/concordância" de quem está
fornecendo os dados, bem como de possíveis autorizações específicas para
futuras utilizações (ex. envio de newsletter, e-mail, mensagens por WhatsApp,
contatos telefônicos, etc.). Pois, o fato de uma pessoa fornecer seus dados
pessoais em um cadastro não lhe dá o direito para uso desta informação. A nova
lei passa a exigir que exista o aceite formal, ou seja, o consentimento
específico da pessoa para o uso daquela informação.
A lei também classifica
determinados dados como sensíveis, que seriam aqueles que, por sua natureza,
devem ter uma proteção mais rigorosa, a exemplo de informações a respeito da
origem (origem racial ou étnica), de crenças (convicções religiosas, as
opiniões políticas, a filiação a sindicatos ou a organizações de caráter
religioso, filosófico ou político), corporais (referentes à saúde, dados
genéticos e dados biométricos) e sexuais (vida sexual).
Outro aspecto importante a
ser observado é que a lei conceitua como Titular dos Dados a pessoa natural a
quem se referem os dados pessoais que são objetos de tratamento. Neste sentido,
os dados são do Titular e não são da Igreja. Portanto, o Titular pode pedir
para corrigir, excluir ou ter a portabilidade dos dados, a qualquer tempo e a
Igreja deve estar preparada para atendê-lo.
A LGPD ainda traz o conceito
da figura do Encarregado da Proteção de Dados que é pessoa indicada pelo
controlador e operador para atuar como canal de comunicação entre o
controlador, os titulares dos dados e a Autoridade Nacional de Proteção de
Dados (ANPD). O Controlador é pessoa natural ou jurídica a quem competem as
decisões referentes ao tratamento de dados pessoais, no caso, a Igreja. Já o
Operador é pessoa natural ou jurídica que realiza o tratamento de dados
pessoais em nome do controlador;
Outra questão importante é
a que cabe a Igreja manter registro sobre as atividades de tratamento dos
dados, de forma que possam ser apresentadas por requerimento dos titulares ou
analisadas pela Autoridade Nacional, em prazo de até 15 dias. Neste sentido, em
caso de solicitação, as Igrejas devem apresentar relatórios que comprovem o
risco de impacto à proteção dos dados pessoais coletados.
Até então, partia-se do
pressuposto que o culpado era quem roubava e divulgava os dados. Mas, com a
nova lei o entendimento é diferente. Quem detém ou coleta o dado é responsável
por guardar e proteger. Em caso de roubo ou vazamento dos dados o responsável
por proteger estes dados será punido por não cumprir com sua obrigação de
guardar seguramente os dados. Neste sentido, há previsão de punições para quem
deixar de proteger os dados dos usuários de acordo com a lei, como a suspensão
de suas atividades relativas a tratamento de dados pessoais de terceiros por
até seis meses ou multas de até 2% de seu faturamento, que poderá chegar até R$
50 milhões, além de dar publicidade sobre a infração. Com isso, não seria nada
interessante ver o nome da Igreja estampado nos jornais como uma instituição
que vaza os dados. Por outro lado, é importante destacar que a própria lei
define os critérios que serão utilizados para as punições. Os principais são: a
gravidade e a natureza das infrações; a boa-fé do infrator; a reincidência; a
adoção reiterada e demonstrada de mecanismos e procedimentos internos capazes
de minimizar o dano, voltados ao tratamento seguro e adequado de dados e a
adoção de política de boas práticas e governança. Portanto, as medidas e
procedimentos que a Igreja vir a tomar, ou deixar de realiza-lo, irá
influenciar na severidade da punição.
A lei é nova. Muitos
aspectos ainda precisam ser regulamentados. Outros pontos, com o tempo,
certamente, terão entendimentos mais esclarecidos. Mas, isso não impede a
aplicação da Lei a partir do início de sua vigência (18 de setembro de 2020).
Ainda no sentido da regulamentação da lei, em 27 de dezembro de 2020 foi criada
a ANPD - Agência Nacional de Proteção de Dados, que é o órgão responsável pela
regulação sobre a proteção de dados pessoais. Responsável por zelar,
implementar e fiscalizar a LGPD.
Uma das sugestões iniciais
é a constituição de um grupo de trabalho para estudar a lei, detectar e
trabalhar para melhorar os pontos fracos nos procedimentos quanto aos dados da
Igreja. Ou seja, proceder as devidas adequações no tocante ao tratamento de
dados pessoais dos membros e visitantes das Igrejas. Se possível, junte pessoas
que conheçam os procedimentos internos da Igreja, com pessoas da Tecnologia da
Informação (informática) e advogados. Eleja o Encarregado pela Proteção de
Dados.
Portanto, com a nova lei
não se admite mais amadorismo no tratamento de dados. Um deslize pode custar
muito caro a Igreja.
A seguir, algumas
situações comuns nas igrejas que podem ensejar problemas com a lei de proteção
de dados:
a)
Visitantes.
Colher informações dos visitantes em formulários para
futuros contatos. Sugestão: incluir uma autorização do visitante para
utilização específica daqueles dados (exemplos: para contatos telefônicos,
e-mail, WhatsApp, etc.). Bem como informá-lo sobre qual a finalidade de
obtenção destes dados e onde serão armazenados;
b)
Rol de Membros.
Colher informações dos membros em
formulários para o rol de membros. Sugestão: incluir uma autorização do membro
para utilização específica daqueles dados (exemplos: para contatos telefônicos,
e-mail, WhatsApp, etc.). Bem como informá-lo sobre qual a finalidade de obtenção
destes dados e onde serão armazenados. Evite colher e manter dados
desnecessários (que nunca serão utilizados. Ex. Cidade de Nascimento, etc.).
Mantenha somente informações que serão úteis, preferencialmente, dados não
sensíveis. Neste sentido, só deve ser mantido dados no Rol de Membros de
pessoas que autorizaram expressamente. No caso de pessoas que não são mais
membros, ou não autorizaram ou já faleceram, caso a Igreja queira manter os
dados para fins históricos e/ou estatísticos, a sugestão é tornar os dados
anonimizados. Ou seja, utilizar meios técnicos razoáveis e disponíveis no
momento do tratamento, por meio dos quais o dado perde a possibilidade de
associação, direta ou indireta, a um indivíduo;
c)
Consulta a SPC/Serasa.
Realizar consultas no SPC e/ou Serasa para
admissão como membro ou para a ocupação de algum cargo ou função. Sugestão:
evite tais consultas. Caso julgue necessária, previamente colha autorização
específica da pessoa que terá seus dados consultados;
d)
Sites, redes sociais e aplicativos.
Política de Privacidade.
Sugestão: inclua no site um texto com a política de privacidade que relate as
práticas realizadas pelo site/aplicativo em relação às informações de seus
visitantes, sejam dados de contato enviados pelo próprio usuário, sejam
informações de navegação (cookies), sobre as páginas visitadas, fontes de
tráfego, localização, entre outras. É preciso esclarecer como esses dados serão
utilizados e para que finalidades e, ainda, se a Igreja vai repassá-los para
instituições/empresas parceiras, por exemplo. Também, evite colher informações
que não serão utilizadas. Caso venha colher, inclua uma autorização para
utilização específica daqueles dados (exemplos: para contatos telefônicos,
e-mail, WhatsApp, etc.). Bem como informá-lo sobre qual a finalidade de
obtenção destes dados e onde serão armazenados; Neste espaço da Política de
Privacidade também deve conter o nome e dados de contatos (e-mail, WhatsApp e
telefone) do Encarregado de Proteção de Dados para solicitações e
esclarecimento de dúvidas dos interessados;
e)
Fotos e Filmagens.
Imagens de cultos e eventos e a manutenção
em arquivos e/ou divulgação no site e/ou redes sociais da Igreja. Sugestão:
embora o tema ainda não tenha um entendimento consolidado, sugere-se
inicialmente que no templo haja avisos em locais de fácil visualização de que o
culto ou evento está sendo filmado e fotografado. Também é aconselhável manter
uma área no templo onde não serão realizados fotos e filmagens (esse local deve
ser informado nos avisos no templo). Outra alternativa é restringir as imagens
ao palco/púlpito. Neste caso, as pessoas que irão aparecer nas imagens
(músicos, cantores, pregadores, etc.) deverão firmar autorização específica e
por escrito. Em qualquer situação, devem ser evitadas as imagens destacadas de
pessoas famosas, menores e de cenas que possam ser julgadas como
constrangedoras;
f)
Informações financeiras
. Algumas Igrejas mantêm e até divulgam
informações financeiras dos membros, dizimistas, patrocinadores, ofertantes,
contribuintes, etc. Sugestão: reavaliar a necessidade da manutenção
dessa informação, objetivando a dispensa de obtê-la (ou seja, não
colher/guardar tal informação);
g)
Atas e correspondências.
Sugestão: evite a inclusão de dados
sensíveis nos documentos das Igrejas, como por exemplo: motivo da
disciplina/exclusão do membro, se a pessoa é membro ou não da Igreja, datas de
admissão, exclusão, etc.;
h)
Fichas de Inscrições em eventos
. É Habitual a necessidade
de preenchimentos de fichas com dados pessoais para participação em congressos,
retiros, convenções, etc.. Sugestão: evite colher e manter dados desnecessários
(que nunca serão utilizados). Mantenha somente informações que irão serão
úteis, preferencialmente, dados não sensíveis;
i)
Dados de Crianças e Adolescentes.
Sugestão: Redobrar os
cuidados com os dados de crianças e adolescentes. Colher e/ou armazenar dados
de menores de 18 anos requer autorização específica dos pais ou
responsáveis;
j)
Confissões.
Sugestão: evitar confissões por meio onde possa,
facilmente, ficar registrada (e-mail, mensagens escritas em papel ou
eletrônicas, etc.);
k)
Fichas de Atendimento Pastoral.
É comum alguns pastores
manterem registros sobre os atendimentos pastorais, em especial nas Igrejas com
vários pastores, para compartilhamento entre a equipe pastoral. Sugere-se que
tenha muito cuidados com os dados anotados, bem como a guarda e compartilhamento
desses dados;
l)
Pedidos de Oração
. É usual a anotação dos pedidos de oração
e possível compartilhamento, em especial pelos grupos de oração e/ou
intercessão de WhatsApp. Sugestão: solicite autorização expressa de quem está
realizando o pedido e tenha cuidado para não ocorrer exposições de situações
indesejadas;
m)
Reconhecimento facial/identificador de emoções
. A
partir de câmeras instaladas nas Igrejas, com softwares (programas de
computadores) específicos, algumas igrejas têm realizado o reconhecimento
facial, identificando as frequências nos cultos e outras utilizando para
identificar emoções (angústia, medo, tristeza, alegria, etc.) e depois utilizam
essas informações para direcionar sermões e aconselhamentos. Sugestão: esta
prática pode ser considerada como uma infração a Lei, portanto deve ser
evitada, a não ser com consentimento expresso (por escrito) e específico da
pessoa;
n)
Segurança da Informação
. Sugestão: Com a nova lei não se
admite mais ter a organização da igreja em planilhas adaptadas, sem qualquer
segurança. Mantenha os dados em sistemas seguros, com senhas fortes. Troque as
senhas frequentemente, especialmente quando algum usuário sair da função.
Mantenha backups (cópias) em locais seguros;
o)
Descartes de Papéis.
Frequentemente, junto com o lixo vão embora
muitos dados que poderão ser utilizados indevidamente. Portanto, quando do
descarte de papéis, procure inutilizá-los, triturando, por exemplo;
p)
Pessoas que colhem/manipulem os dados
. Sugestão: as pessoas que
colhem e/ou manipulem os dados (secretárias, tesoureiros, etc.) devem firmar um
Termo de Responsabilidade junto à Igreja onde fique claro o comprometimento
quanto ao sigilo, não vazamento, não utilização para outro fim e de tomada de
todas as medidas no sentido de proteção dos dados;
q)
Serviços de Terceiros
. Igrejas que utilizam serviços de
terceiros como: fornecimento de softwares, manutenção de equipamentos de
informática, serviços de vigilância, de contador, etc. devem tomar os devidos
cuidados. Sugestão: certificar-se que esses fornecedores de serviços estão
adequados a Lei Geral de Proteção de Dados, reduzindo-se, assim, o vazamento de
dados por intermédio de terceiros.
Por fim, têm-se dúvidas
quanto as Convenções, Federações e Associações de Igrejas se estas estão
obrigadas a observar a Lei Geral de Proteção de Dados, por tratarem de dados de
outras pessoas jurídicas (Igrejas) e não de pessoas físicas. Inicialmente cabe
salientar que a LGPD visa a proteção de dados pessoais (artigo 1º da LGPD),
portanto de pessoas físicas. Logo, os dados de pessoas jurídicas (Igrejas) não
estariam sujeitos a LGPD. Por outro lado, caso uma pessoa jurídica (Igreja)
entenda que foi prejudicada pelo mau uso de seus dados, nada impede que vá até
a justiça reclamar os seus direitos e o juiz aplique, por analogia, a LGPD.
Portanto, sugere-se que por prudência, as Convenções, Federações, Confederações
e Associações de Igrejas observem a LGPD quanto aos dados das Igrejas
associadas, no que couber.
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Marcone
Hahan de Souza. Contador e Administrador. Professor Universitário. Responsável
pelo site M&M
Contabilidade de Igrejas.
A M&M Assessoria Contábil possui uma área especializada no
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