Antes da Lei 13.467/2017 (Reforma
Trabalhista) não havia qualquer possibilidade legal do empregado e empregador
fazer um acordo de desligamento que pudesse, ao mesmo tempo, atender a vontade
do empregado em ser desligado da empresa para poder sacar o FGTS e o
seguro-desemprego, ou de atender a vontade do empregador em desligar o
empregado sem ter que desembolsar os 40% da multa do saldo fundiário a que o
empregado tem direito.
Isto porque, em síntese, só haviam duas
possibilidades de ocorrer o desligamento, sendo:
a) Empregado pede demissão: neste caso não
teria direito ao aviso prévio indenizado, ao saque do FGTS, nem à multa de 40%
do saldo fundiário, bem como não teria direito ao seguro desemprego; e
b) Empresa demite o empregado: neste caso a
empresa teria que arcar com todos os custos de um desligamento imotivado, ou
seja, pagar o aviso prévio (trabalhado ou indenizado), depositar a
multa de 40% sobre o saldo fundiário e conceder as guias para saque do FGTS e
recebimento do seguro desemprego.
Ainda que não houvesse lei que permitisse o
"acordo de rescisão", na prática não eram raros os casos em que a
empresa fazia o desligamento do empregado, pagava a multa de 40% e depois o
empregado devolvia "por fora" o valor da multa para a empresa, configurando
a chamada rescisão fraudulenta.
Nestes casos, se o Ministério do Trabalho
apurasse que houve a rescisão fraudulenta, além de aplicar multa para a
empresa, poderia ainda determinar a devolução dos valores recebidos
indevidamente.
Há decisões ainda que condenam o empregado
pelo crime de estelionato, uma vez comprovado que a rescisão foi fraudulenta
com o intuito exclusivo de sacar o FGTS e receber o
seguro-desemprego, já que empresa e empregado estariam fraudando documentos
para causar prejuízo ao erário público, conforme jurisprudência abaixo:
PENAL. ESTELIONATO MAJORADO. CONCURSO
MATERIAL. SEGURO-DESEMPREGO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICÁVEL.
ELEMENTAR DO TIPO. ARDIL. PRESENTE. VÍNCULO INFORMAL DE TRABALHO. (...) .
PREJUÍZO/DANOS CAUSADOS. JUSTIÇA GRATUITA. ISENÇÃO DAS CUSTAS PROCESSUAIS. 1.
Apelante que, após dissimular com a firma individual do corréu, por 02 (duas)
vezes, Rescisão de Contrato de trabalho, deu entrada no requerimento
de seguro-desemprego, recebendo, de forma fraudulenta, 04 (quatro) parcelas do
benefício, de julho a outubro/2001, além de mais 05 (cinco) parcelas, de agosto
a dezembro/2004, praticou o crime do art. 171, § 3º, c/c o art. 69 do CP
(estelionato majorado em concurso material, duas vezes). 2. Nos delitos de
estelionato praticados em relação ao recebimento de seguro-desemprego não se
aplica o princípio da insignificância. (Precedentes deste Tribunal Regional e
do Superior Tribunal de Justiça). 3. O ardil está materializado na simulação da
dispensa imotivada, situação que possibilitou ao apelante receber as parcelas
indevidas do seguro-desemprego. 4. Comete o crime de estelionato majorado (art.
171, § 3º, do CP) o agente que, demitido sem justa causa, recebe parcelas do
seguro-desemprego, mas mantém o vínculo informal de trabalho, posteriormente
reconhecido em reclamação trabalhista. (Precedente da Turma). 5. Não há
que se falar em erro de proibição (art. 21 do CP), quando as provas dos autos
afastam a alegada boa-fé e demonstram a presença do dolo em receber a vantagem
indevida. 6. O art. 171, § 1º, do CP trata da hipótese de estelionato
privilegiado e determina que se "o criminoso é primário, e é de pequeno
valor o prejuízo, o juiz pode aplicar a reprimenda conforme o disposto no art.
155, § 2º", ou seja, diminuída de um a dois terços, ou aplicando somente a
pena de multa. Entende a jurisprudência que o prejuízo de "pequeno valor"
não pode ultrapassar o salário mínimo vigente na época dos fatos. (Precedente
do STJ e desta Turma). 7. Na hipótese, embora o réu seja tecnicamente primário,
não se pode considerar de pequeno valor o "prejuízo" causado ao Fundo
de Amparo ao Trabalhador no montante de R$ 2.020,00 (dois mil e vinte reais),
que ultrapassa, em muito, o salário mínimo vigente na época dos
fatos: R$ 180,00 (cento e oitenta reais) em 2001 e R$ 260,00 (duzentos e
sessenta reais) em 2004. 8. O cálculo da pena-base ocorreu em estrita
observância do determinado pelo art. 59 do CP. 9. Esta Turma, em consonância
com o Superior Tribunal de Justiça, já decidiu que, embora o pagamento do
benefício do seguro-desemprego seja efetivado em parcelas, trata-se de um único
crime, não sendo hipótese de continuidade delitiva (art. 71 do CP). (Precedente
do STJ e da Turma). 10. Deferido o benefício da Justiça Gratuita ao apelante
assistido pela Defensoria Pública da União. 11. Há que ficar sobrestado o
pagamento de custas e despesas processuais enquanto perdurar o estado de
pobreza do condenado pelo prazo máximo de 05 (cinco) anos, quando então estará
prescrito, nos termos do art. 12 da Lei 1.060/1950 ou pelo prazo de 05 (cinco)
anos, cabendo ao Juízo da Execução verificar a real situação financeira do réu.
12. Apelação do Ministério Público Federal desprovida. 13. Apelação do réu
parcialmente provida. (ACR 0011001-77.2011.4.01.3800 / MG, Rel. JUÍZA FEDERAL
ROSIMAYRE GONÇALVES DE CARVALHO (CONV.), TERCEIRA TURMA, e-DJF1 de 07/04/2017).
Com a inclusão do art. 484-A da CLT (Reforma
Trabalhista), o acordo entre empregador e empregado para extinção do contrato
de passou a ser válido (a contar de 11.11.2017), deixando de ser fraude, desde
que obedecidos alguns critérios.
O novo artigo celetista estabeleceu que no
caso de acordo no desligamento, serão devidas as seguintes verbas trabalhistas:
a) Metade do aviso prévio (15
dias), se indenizado;
b) Metade da multa rescisória sobre o saldo
do FGTS (20%) prevista no § 1º do art. 18 da Lei 8.036/1990;
c) Todas as demais verbas trabalhistas
(saldo de salários, Férias vencidas e proporcionais
indenizadas, 13º Salário e etc.) na integralidade;
d) Saque de 80% do saldo do FGTS;
e) O empregado não terá direito ao
benefício do seguro-desemprego;
Vale ressaltar que qualquer acordo fora do
previsto legalmente, bem como anotações na CTPS com o intuito de demonstrar
um vínculo de emprego que não existiu ou de um desligamento que não
ocorreu, para se valer do recebimento do FGTS ou do seguro-desemprego, ainda
continua sendo fraude e configura crime de estelionato previsto no art. 171 do
Código Penal.
Por Sergio
Ferreira Pantaleão é Advogado, Administrador, responsável técnico pelo Guia
Trabalhista e autor de obras na área trabalhista e previdenciária.