A
legislação trabalhista engloba uma série de princípios de proteção ao
trabalhador, este que é considerado, via de regra, como o hipossuficiente (o
mais frágil) na relação contratual.
A
própria CLT, ao definir o conceito de empregador, dispõe como sendo
aquele que assume os riscos da atividade, mas que detém o poder de mando, ou
seja, dirige a prestação de serviço.
Assim,
visando a limitação da arbitrariedade do empregador ao exercer este poder de
mando, o legislador buscou equilibrar esta desigualdade ao estabelecer no art.
468 da CLT que:
"Nos
contratos individuais de trabalho só é lícita a alteração das respectivas
condições por mútuo consentimento, e ainda assim desde que não resultem, direta
ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula
infringente desta garantia."
A grande dificuldade na
aplicação da lei está na subjetividade ao aplicá-la, uma vez que a leitura do
dispositivo legal pode trazer diversas interpretações, considerando que a
Constituição Federal antecede a interpretação de qualquer legislação
infraconstitucional.
Sob esta análise interpretativa
da norma, rebaixar um empregado de função em decorrência de extinção de cargos,
por extinção de áreas, setores ou atividades específicas, por motivo de punição
disciplinar ou qualquer outro motivo que afronta o dispositivo legal, não
é admitido pela legislação trabalhista. Extrai-se, neste sentido, o
entendimento de que qualquer alteração contratual prejudicial ao empregado é
nula.
A interpretação da lei está no
que se considera prejudicial
ao empregado, pois tem-se, com assertividade, que não se trata
apenas da questão pecuniária, mas também de outras questões que envolvem a
relação de emprego.
Qualquer alteração contratual,
conforme art. 468 da CLT, deve observar os seguintes requisitos:
a) mútuo consentimento
(concordância) das partes;
b) que da alteração o empregado
não sofra nenhum prejuízo, direta ou indiretamente, não só pecuniários, mas de
qualquer natureza (como moral, de benefícios, jornada de trabalho,
vantagens, saúde e segurança entre outras) anteriormente garantidos.
Portanto, qualquer alteração em
desconformidade com os requisitos acima, não produzirá qualquer efeito no contrato
de trabalho.
Neste viés, o rebaixamento de
função em razão de reestruturação de cargos e salários da empresa,
ainda que seja mantida a sua remuneração, traz um prejuízo moral evidente
ao empregado, não sendo admitido nem mesmo por mútuo consentimento.
Isto decorre do fato de o
empregado, por exemplo, que exerce cargo de chefia e é rebaixado de função,
ficar exposto a uma situação vexatória e humilhante perante seus colegas de
trabalho, em especial de seus subordinados, os quais passarão a demonstrar
indiferença para com o ex-chefe.
Assim, ainda que o empregador
não tenha comprometido financeiramente o empregado ao rebaixá-lo, o prejuízo
causado neste exemplo é moral, violando o inciso X do art. 5º da Constituição
Federal, bem como o art. 927 do Código Civil, por ser um ato ilícito praticado
pelo empregador.
Também causa prejuízo ao
empregado o rebaixamento de função realizado como meio de punição por mau
desempenho em razão de metas inatingíveis estabelecidas pela empresa. Neste
caso, a empresa deve reavaliar quais os motivos deste mau desempenho (falta
de treinamento, de equipamentos e ferramentas para desenvolver o trabalho)
e se as metas estabelecidas estão condizentes com a situação real de mercado de
trabalho.
Por outro lado, não se estará
falando em rebaixamento quando o empregado é elevado a um cargo superior, e que
sua permanência nesta nova função dependa de seu desempenho durante um período
de experiência, devidamente acordado entre as partes, ou seja, a
manutenção do cargo novo dependerá do desempenho do empregado de acordo com as
expectativas da empresa.
Se isso não ocorrer, a empresa
poderá remanejar o empregado para a função anterior ou equivalente, sem que
isto caracterize a violação do dispositivo legal.
Outra condição que possibilita
o remanejamento para função anterior é aquela em que o empregado é designado
para exercer cargo de confiança, consoante o disposto no parágrafo 1º do
art. 468 da CLT (alterado pela Lei 13.467/2017):
"§
1º - Não se considera alteração unilateral a determinação do empregador para
que o respectivo empregado reverta ao cargo efetivo, anteriormente ocupado,
deixando o exercício de função de confiança."
De confiança há de ser toda
função quando a pessoa que a exerce se substitui à do empregador para contratar
em seu nome. Participa então o emprego da natureza do mandato, em que o
elemento confiança lhe é atributo principal.
Há uma diferença no conceito
apresentado no dispositivo supracitado em relação ao que foi abordado
anteriormente, pois aqui não se está falando em rebaixamento e sim, em reversão
de função.
Rebaixamento de função tem um
caráter punitivo, prejudicial, seja financeiro ou moralmente falando. Já a
reversão da função configura o retorno do empregado à função primitiva, uma vez
que este estava investido de determinada função (de confiança) em caráter
provisório, sem a intenção de punir e, portanto, válida, lícita.
Não obstante, aqui se apresenta
a subjetividade na interpretação da lei, pois a função de confiança só se
verifica analisando o caso concreto, onde o cargo em si pode até parecer de
confiança, mas a função efetivamente exercida demonstra que o empregado não
detinha o poder de mando.
Deve-se observar, neste caso,
se a função exercida era ou não de confiança para só então estabelecer se houve
prejuízo ao empregado no ato praticado pelo empregador de reverter ao cargo
anteriormente ocupado.
Portanto, há que se observar no
caso concreto se houve ou não o rebaixamento de função, mas uma vez configurado
o ato, o empregado rebaixado de função (ainda que o nível salarial não tenha
sofrido alteração) poderá pleitear judicialmente a indenização por danos
morais pelo constrangimento pessoal e pela humilhação (em ver-se exonerado
de cargo de nível superior), bem como pleitear eventual diferença salarial
decorrente deste rebaixamento, caso o nível salarial não tenha sido mantido.
Consoante o que dispõe o art.
483 da CLT, o empregado prejudicado também poderá postular judicialmente
a rescisão indireta do contrato de trabalho, por conta da falta grave
praticada pelo empregador.
Por outro lado, caso tenha
ocorrido apenas uma reversão do cargo de confiança (nos termos do art. 468, §
1º da CLT), não se estará falando em rebaixamento de função ou prejuízos
salariais ou morais.
Por Sergio Ferreira
Pantaleão é Advogado, Administrador, responsável técnico pelo Guia Trabalhista
e autor de obras na área trabalhista e previdenciária.