A Justiça do Trabalho
reconheceu o vínculo de emprego doméstico pretendido por uma trabalhadora que
comparecia na residência da ré em quatro dias por semana. Ela recebia como
diarista e fazia um pouco de tudo, como cozinhar, limpar a casa e auxiliar nos
cuidados com a mãe da reclamada, uma senhora idosa. A sentença é do juiz
titular da 5ª Vara do Trabalho de Juiz de Fora. Após examinar as provas, ele
reconheceu a presença dos pressupostos essenciais ao vínculo de emprego de
natureza doméstica, na forma prevista no artigo 1º da Lei 5859/1972: (1)
prestação de serviços de natureza contínua, (2) de finalidade não-lucrativa,
(3) à pessoa ou família no âmbito residencial destas.
Na ação trabalhista, a autora
afirmou ter sido admitida como empregada doméstica pela ré em fevereiro de
2013, com salário mensal de R$ 2.020,00. Disse ter sido dispensada sem justa
causa em fevereiro de 2021 e que nunca teve a carteira de trabalho anotada, nem
recebeu direitos trabalhistas pelo vínculo de emprego.
Em sua defesa, a reclamada
alegou que contratou a reclamante como diarista, inicialmente, para trabalhar
uma vez por semana, reconhecendo que ela passou a trabalhar por quatro dias na
semana, mas somente a partir de março de 2017. Disse que, mesmo depois disso, a
autora sempre trabalhou como autônoma, sem subordinação, inclusive com a
responsabilidade pelo recolhimento previdenciário. Ponderou que já havia uma
empregada doméstica na residência, além de outra pessoa que atuava como
acompanhante, passando a noite com sua mãe, uma senhora acamada de 98 anos de
idade.
No exame das provas,
principalmente a testemunhal, o magistrado concluiu pela presença do vínculo de
emprego, a partir de março de 2017 até abril de 2021 (considerada a projeção ao
aviso-prévio proporcional de 39 dias). E a reclamada foi condenada na sentença
a anotar a CTPS da empregada doméstica e a pagar férias, 13º salário,
aviso-prévio indenizado proporcional (39 dias) e FGTS + 40%, além da multa
prevista no artigo 477, parágrafo 8º, da CLT, correspondente à maior
remuneração (R$ 1.920,00), tendo em vista o atraso no pagamento das verbas
rescisórias. A existência de vínculo de emprego no período anterior, ou seja, a
partir de fevereiro de 2013 (como havia pretendido a autora) foi descartada
pelo julgador.
Na decisão, o magistrado
ressaltou que, com a publicação da Lei Complementar 150/2015 (2/6/2015), foi
sedimentada a discussão em torno de quantos dias da semana são necessários para
a configuração da continuidade, prevendo o artigo 1º que: "Ao empregado doméstico,
assim considerado aquele que presta serviços de forma contínua, subordinada,
onerosa e pessoal e de finalidade não lucrativa à pessoa ou à família, no
âmbito residencial destas, por mais de 2 (dois) dias por semana, aplica-se o
disposto nesta Lei."
No caso, a ré admitiu que, a
partir de 30/3/2017, quando sua mãe sofreu uma queda e passou a demandar mais
cuidados, a autora, que antes atuava apenas uma vez por semana, passou a
trabalhar quatro dias na semana, ao pagamento de R$ 120,00 por dia de trabalho,
o que resultava em pagamento mensal de R$ 1.920,00. No entanto, entendeu que
não se configurou o vínculo de emprego, sob a alegação de ausência de
subordinação, porque a reclamante fazia apenas "o que queria".
De acordo com o julgador, a
ré, ao apresentar fatos impeditivos do direito pretendido, atraiu para si o
encargo processual de provar suas alegações, nos termos dos artigos 818 da CLT
combinado com artigo 373, II, do CPC/2015. Entretanto, o magistrado entendeu
que a reclamada não conseguiu comprovar suas alegações. Isso porque a prova
testemunhal foi favorável à trabalhadora.
Foram ouvidas várias
testemunhas, inclusive o zelador do prédio, a antiga fisioterapeuta da idosa,
que comparecia no local cerca de três vezes por semana, e a empregada doméstica
da residência desde 2008, esta, nas palavras do juiz, "com profundo
conhecimento sobre a rotina". As testemunhas confirmaram que a autora
trabalhava quatro dias por semana na residência, o que ocorreu a partir da
queda da mãe da reclamada, em 31/3/2017. Antes dessa data, houve divergências
nos depoimentos, razão pela qual prevaleceu, para fins de reconhecimento do
vínculo empregatício, o marco reconhecido na defesa. Baseou-se o julgador, mais
uma vez, no depoimento da empregada doméstica que trabalhava como efetiva desde
2008 e que admitiu que a autora passou a trabalhar quatro vezes na semana
depois da queda da mãe da reclamada, para além das tarefas de faxina,
auxiliando-a na cozinha e nas compras.
"É o que basta para
identificação dos requisitos necessários à caracterização do vínculo: trabalho
em âmbito residencial, sem fins lucrativos, com subordinação e dependência
financeira. Concluiu-se, portanto, que a reclamante não era apenas uma
diarista, responsável pela faxina da residência, mas sim empregada doméstica
propriamente dita, encarregada de todos os afazeres da casa, ainda que em
parceria com outra trabalhadora", concluiu o magistrado.
Modalidade da rescisão
contratual - A ré afirmou que a autora teria dado causa à rescisão do contrato,
por desídia e insubordinação, o que, entretanto, não foi provado. Segundo
pontuou o juiz, tendo em vista o princípio da continuidade da relação de
emprego, exige-se prova contundente da prática de ato grave o suficiente para a
quebra da confiança entre as partes, o que não se verificou, no caso.
Na sentença, a reclamada foi
condenada a pagar à autora, além dos direitos trabalhistas decorrentes do
vínculo de emprego, as parcelas devidas pela dispensa sem justa causa,
incluindo férias e décimo terceiro salário proporcionais, aviso-prévio e multa
rescisória de 40% do FGTS, tendo como base o salário mensal de R$ 1.920,00. Não
houve recurso ao TRT-MG e o processo já está em fase de execução.
Fonte: Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região / Síntese
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