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A exclusão de sócio por justa causa: análise do caso Monark


Publicada em 21/06/2022 às 09:00h 


Inicialmente, iremos nos debruçar sobre as hipóteses de cabimento no nosso ordenamento jurídico pátrio para a exclusão de sócio por justa causa. Tão somente após a análise deste tópico comentaremos o caso Monark (Flow Podcast), oportunidade na qual vamos nos restringir ao estudo jurídico das consequências societárias a partir da repercussão do ato do sócio Bruno Aiub, conhecido no mundo digital pelo apelido de  Monark.



Desde já, temos o dever de esclarecer que os comentários sobre o ocorrido serão baseados nas informações que foram divulgadas pela imprensa e não refletem necessariamente a realidade dos fatos, dado que os autores deste artigo não possuem qualquer relação com os envolvidos.



A exclusão de sócio por justa causa é uma temática que gera debate tanto na doutrina como na jurisprudência. Por óbvio, quando estamos diante de um ente societário no qual parte de seus membros deseja excluir outro da relação jurídica, há cenário conflituoso, no qual já ocorreu a quebra da affectio societatis em relação àquele integrante.



Há dois modos de efetivar a exclusão de sócio por justa causa: extrajudicialmente e judicialmente. A primeira depende de prévia previsão no contrato social, enquanto a segunda encontra fundamento direto na legislação. Vejamos.



Com a finalidade de facilitar o entendimento pelas pessoas leigas no direito, vamos iniciar com a análise da exclusão do sócio por justa causa extrajudicialmente, a qual somente é cabível nas hipóteses em que há cláusula no contrato social prevendo a possibilidade de exclusão de sócio em determinadas circunstâncias.



Para tanto, é necessário o preenchimento de alguns outros requisitos. Deve haver a pratica de ato que inegavelmente coloque em risco a continuidade da sociedade e, evidentemente, que o sócio excluído seja minoritário, ou seja, que este não detenha mais de 50% do capital social. Isso porque, caso se pretenda excluir sócio majoritário por justa causa, somente poderá ser feita via ação judicial, uma vez que matematicamente não há como atingir a maioria do capital para a deliberação.



Todo o exposto apresenta-se em consonância com o artigo 1.085 do Código Civil de 2002, caputin verbis:


"Artigo 1.085. Ressalvado o disposto no artigo 1.030, quando a maioria dos sócios, representativa de mais da metade do capital social, entender que um ou mais sócios estão pondo em risco a continuidade da empresa, em virtude de atos de inegável gravidade, poderá excluí-los da sociedade, mediante alteração do contrato social, desde que prevista neste a exclusão por justa causa".



Constata-se uma vez mais a relevância do princípio da preservação da empresa possui no Direito Empresarial. Não somente na norma como também nos documentos societários há uma preocupação latente: a manutenção da atividade econômica, pois dela advém riquezas, empregos, renda, bens, serviços, dentre outros elementos fundamentais para a comunidade como um todo.



Sendo assim, no momento da constituição da sociedade empresária, quando os futuros sócios estão amparados por uma equipe de advogados especializada, certamente estes são orientados a dispor expressamente no contrato social acerca da possibilidade de exclusão de sócio por justa causa. E não somente isto: esses profissionais, já conhecedores dos imbróglios mais recorrentes no decorrer da atividade, auxiliam os seus clientes para intentar abarcar no contrato social e/ acordo de sócios todos os eventuais problemas e respectivas soluções.



Assim, uma discordância que poderia resultar na dissolução parcial ou total da sociedade empresária, pode ser encerrada por uma cláusula bem escrita que preveja exatamente aquela ocorrência e a resolução em que os sócios acordaram de antemão que fosse aplicada a fim de o conflito não seja escalonado.



Decerto, quando há uma vontade entre os sócios de excluir um deles, o desacordo já atingiu grau irreversível, porém devemos levar em consideração que a dissolução total da sociedade deve ser a última ratio e, dentro da dissolução parcial da sociedade, a qual revela-se mais benéfica, há três meios de formalização: extrajudicialmente, por livre vontade ou por previsão no contrato social com a devida deliberação pela maioria do capital social, e judicialmente, a qual trataremos mais detidamente posteriormente.



Em pesquisa ao caso do Monark, vê-se que o mesmo colocou-se à disposição para sair voluntariamente da sociedade, pois reconheceu que o seu discurso durante um dos episódios do Flow Podcast reverberou tão negativamente no público que a única solução para continuidade das atividades empresariais era a sua saída do quadro societário.



Neste ponto, insta destacar que não faremos juízo de valor acerca das palavras ditas pelo comunicador, vamos nos ater ao impacto que sua fala gerou ao tipo societário: no dia imediatamente seguinte, diversos patrocínios de empresas anunciantes que possibilitavam a manutenção da estrutura física e do quadro de funcionários foram subitamente cortados, artistas e outras personalidades que participaram de programas anteriores como convidados solicitaram a retirada dos vídeos do ar, o que provoca outra acentuada baixa financeira porque uma vez que os vídeos são retirados das plataformas, os criadores deixam de receber os adsense (monetização do conteúdo postado) referente ao conteúdo excluído, a audiência despencou, dentre outras inúmeras consequências que poderíamos citar.



A permanência do Bruno Aiub (Monark) como apresentador no podcast e na sociedade empresária acarretaria ainda mais prejuízos à esta última, pois o ato reprovado pela coletividade partiu tão somente de sua pessoa. Sendo assim, a sua exclusão naquela oportunidade pareceu ser medida imperativa para possibilitar a continuidade das atividades empresárias, a manutenção do emprego de dezenas de pessoas, etc. Em suma, nota-se que deve ser priorizado o interesse social em detrimento do interesse individual do sócio.



E nesta hipótese em comento se por acaso o youtuber não concordasse com a sua exclusão da sociedade, os sócios que possuem mais de metade do capital social poderiam deliberar pela exclusão por justa causa e, caso aprovado, realizar o respectivo protocolo na Junta Comercial de São Paulo, pois fora verificado que havia essa previsão no contrato social da IB Holding de Participações Ltda, controladora da Flow Producao De Conteudo Audiovisual Ltda.



Foi amplamente reproduzido nas redes sociais uma tabela que indica a porcentagem do capital social de cada um dos integrantes, na seguinte proporção: Bruno Monteiro Aiub (Monark), 49,75%; Igor Rodrigues Coelho, 49,75%; Gianluca Santana Eugenio, 0,50%. Diante disso, os dois últimos sócios, Igor e Gianluca, poderiam decidir pela retirada do Monark da sociedade, corretamente alicerçados na cláusula de exclusão por justa causa do contrato social.



Por fim, temos a viabilidade do ajuizamento de ação ordinária de dissolução da sociedade para exclusão de sócio por justa causa, a qual não necessita de prévia disposição no contrato social, posto que encontra guarida no art. 1.080 do Código Civil de 2002, caput, ipsis litteris:


"Artigo 1.030. Ressalvado o disposto no artigo 1.004 e seu parágrafo único, pode o sócio ser excluído judicialmente, mediante iniciativa da maioria dos demais sócios, por falta grave no cumprimento de suas obrigações, ou, ainda, por incapacidade superveniente."



No caso em concreto, não foi necessário recorrer ao Poder Judiciário pois, apesar do ato do sócio ter nitidamente posto em risco a continuidade da empresa, é interessante observar que a affectio societatis restou preservada, apesar de todo o ocorrido e o imenso rombo financeiro suportado pela empresa como um todo, pois Bruno Aiub retirou-se voluntariamente da sociedade limitada e mantém boa relação com os seus antigos sócios, o que não é comum em hipóteses análogas.




Referências Bibliográficas


Exclusão de sócio: como funciona o paredão da vida empresarial. CHC Advocacia. Publicado em 18.09.2022. Disponível em: <https://chcadvocacia.adv.br/blog/exclusao-de socio/#A_exclusao _de_socio > Acesso em 31.05.2022.
FINKELSTEIN, Maria Eugênia. Exclusão por Justa Causa: Necessidade de Assembleia Específica. Disponível em: <https://genjuridico.jusbrasil.com.br/artigos/577911495/exclusao-por-justa-ca usa-necessidade-de-assembleia-especifica#:~:text=Cal%C3%A7as.%5B11%5D-,Nos%20termos% 20do%20art.,de%20atos%20de%20ineg%C3%A1vel%20gravidade> Acesso em 31.05.2022.
Monark pode ser demitido ou desligado de sua própria empresa? Entenda o caso. G1, Publicado em 09.02.2022. Disponível em <https://g1.globo.com/empreendedorismo/noticia/2022/02/09/monark-pode-ser-demitido-ou-desligado-de-sua-propria-empresa-entenda-o-caso.ghtml>. Acesso em 31.05.2022.
The Control Contabilidade, CASO MONARK X FLOW | O desligamento Societário, e o que podemos aprender com isso. Youtube, Publicado em 09.02.22. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=srbREQlV-o4> Acesso em 31.05.2022.
TOMAZETTE, Marlon. Curso de direito empresarial: Teoria geral e direito societário, v. 1, 8. ed. rev. e atual, São Paulo: Atlas, 2017.

 






Por Raul Bergesch é advogado na área do Direito Empresarial, especialista em proteção patrimonial, sócio-fundador do escritório Raul Bergesch Advogados e membro do Instituto Brasileiro de Direito Empresarial (Ibrademp) e da Comissão de Direito Falimentar da OAB-RS, subseção de Novo Hamburgo.

 







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