Suponha que um amigo compartilha com você,
durante uma conversa descontraída, uma ideia inovadora para criar um negócio.
Você, empolgado com a perspectiva de sucesso no empreendimento, oferece auxílio
financeiro para montar a empresa.
Nessa situação, você e seu amigo poderiam
constituir uma sociedade? Sim, poderiam. Todavia, imagine que, devido a
condições econômicas ou qualquer outro fator, vocês optam por não constituir
formalmente a empresa na Junta Comercial.
Após a ideia inicial, vocês fazem o
seguinte acordo: você custeará todos os gastos iniciais que a empresa tiver.
Quando o empreendimento começar a auferir lucros, você e seu colega registrarão
a empresa e cada um terá direito a metade dos lucros. Pela confiança depositada
em seu amigo, você decide não firmar um acordo escrito, fazendo apenas um
contrato "de boca".
Depois de muitos investimentos seus, o
negócio começa a dar certo e a receber lucros, mas o seu "futuro
sócio" não lhe repassa dinheiro algum. Depois você descobre que seu
amigo já inscreveu a sociedade na Junta Comercial sem lhe informar, não o
colocando como sócio nem mencionando seu nome em momento algum no contrato
social.
E agora, o que você poderá fazer? Poderá
ingressar com uma ação judicial para tentar obter seus direitos, mas como
conseguirá comprovar que você e seu amigo firmaram um contrato se ele foi
verbal e somente vocês tinham conhecimento?
Por esse motivo, é essencial que seja
firmado um Memorando de Entendimentos (MoU), de modo a alinhar os termos e os
detalhes da negociação. Mas o que é um MoU? Quando pode ser utilizado? Essas e
outras dúvidas serão respondidas adiante.
O que
é um memorando de entendimento (MoU)?
Qual
sua importância?
O Memorando de Entendimento (MoU) é um
contrato preliminar que tem como principal finalidade estabelecer os principais
termos do contrato, como o objeto da negociação, a atuação de cada parte (ex.
um ficará responsável pela administração do negócio e outro pela parte
econômica), os valores que cada parte investiu, a forma de pagamento etc.
Como se trata de um contrato preliminar, o
MoU só vincula as partes se, futuramente, houver a formalização de um contrato
definitivo. Mas qual é, então, a vantagem em elaborar um Memorando de
Entendimentos?
Vejamos o cenário inicial: caso você e seu
amigo tivessem elaborado um MoU ao invés de pactuar toda a sua negociação de
forma verbal, você possuiria um instrumento apto a comprovar seu direito em
eventual processo judicial, bem como poderia obrigar seu colega a cumprir com o
pactuado - modificar o contrato social para que seu nome passasse a
constar como sócio, nos termos do que estivesse previsto no contrato.
Tal situação é mais recorrente do que se
imagina. Duas das maiores empresas do mundo - McDonald's e Facebook - enfrentaram
sérios problemas por não darem a devida importância a essa espécie de contrato.
Os irmãos Winklevoss processaram Mark
Zuckerberg sob a alegação de que foram eles os idealizadores da rede social
hoje conhecida como Facebook e
que Zuckerberg teria ficado responsável apenas pela parte da programação do projeto.
O desfecho desse caso foi um acordo milionário celebrado entre os irmãos e o
proprietário da rede social.
Situação semelhante é retratada no filme
"Fome de Poder", que conta a história do desenvolvimento da rede
de fast food McDonald's. A franquia
foi fundada pelos irmãos Richard e Maurice McDonald, que criaram uma forma de
negócio inovadora, focada principalmente nos baixos preços, na rapidez do
preparo e na alta rotatividade de clientes.
Algum tempo após a fundação da empresa, o
representante comercial Ray Kroc tomou conhecimento da existência do
McDonald's, ocasião em que se ofereceu para representar a marca.
Em pouco tempo, Kroc se tornou franqueador
do negócio e passou a buscar novos franqueados com o objetivo de transformar o
restaurante em uma empresa de nível nacional.
Alguns anos depois, Ray fez uma proposta
aos irmãos: comprar a empresa por 2,7 milhões de dólares em dinheiro, ficando
seus fundadores com 0,5% dos lucros.
Infelizmente, o contrato foi celebrado
apenas de forma verbal e Kroc nunca repassou a porcentagem de lucros prometida
para os irmãos McDonald's.
Esses são apenas alguns dos exemplos de
empresários que tiveram perdas imensas em seus lucros pela falta de um
Memorando de Entendimentos. A celebração desse contrato, portanto, tem como
principais benefícios:
- Maior organização para a empresa: o
MoU serve como um guia para seus sócios em eventuais dúvidas a respeito do
negócio. Além disso, é um atrativo para investidores, pois estes se sentirão
mais à vontade para empregar seu dinheiro em uma empresa que tem todos os seus
termos registrados do que em uma que decide tudo no "boca a boca";
- Servir como prova documental em
eventual processo ajuizado;
- Vincular as partes a suas
disposições no momento da elaboração do contrato social.
Quais
informações podem constar em um MoU?
Um MoU segue os requisitos de um contrato
comum, devendo obedecer os requisitos de validade previstos em lei: partes
capazes, objeto lícito e possível e forma não proibida por lei.
Desse modo, diversas informações referentes
ao negócio podem constar no MoU, como, por exemplo, as seguintes: qualificação
das partes envolvidas; descrição do objeto; exigência de sigilo e
confidencialidade; obrigações e direitos das partes etc. Tais matérias são
apenas um exemplo de quais dados podem ser inseridos em um MoU. A depender da
especificidade de cada negócio, poderão ser acrescentadas ou retiradas
informações.
Quais
as espécies de memorando de entendimento (MoU)?
Quando
cada uma pode ser utilizada?
Apesar de os Memorandos de Entendimento
serem utilizados com mais frequência na fase inicial de startups, ele não se
limita a regular esses tipos de relações, existindo outras espécies de MoU,
como, por exemplo:
- MoU entre empresas: serve para
tratativas preliminares sobre parcerias, troca de informações e produtos etc;
(por exemplo: tenho uma empresa de energia solar. Pretendo expandir meu negócio
para outra cidade, celebrando um MoU com uma construtora do município para o
qual pretendo disseminar minhas atividades.)
- MoU Internacional: celebrado entre
governos, entre empresas de países distintos ou entre uma empresa e um governo
estrangeiro.
- MoU entre órgãos públicos: é utilizado, por
exemplo, para garantir parcerias em investigações, sincronização de informações
etc.
Como se pode observar, o Memorando de
Entendimento é de fundamental importância para resguardar sua startup de
eventuais riscos do negócio. Entretanto, como qualquer espécie contratual,
faz-se necessário contar com uma boa assessoria jurídica para garantir que o
contrato celebrado seja válido e possua todas as informações pertinentes à sua
empresa.
REFERÊNCIAS
ALMEIDA, Marcell. Irmãos Winklevoss
desistem do Facebook e aceitam acordo judicial de Zuckerberg. TechTudo Notícias, [S. l.], p. 1-1, 23 jun.
2011. Disponível em: https://www.techtudo.com.br/noticias/2011/06/irmaos-winklevoss-desistem-do-facebook-e-aceitam-acordo-judicial-de-zuckerberg.ghtml.
Acesso em: 28 jul. 2022.
BERNARDES, Paula. Memorando De Entendimento
(MoU): O que é e quando sua Startup deve fazer?. Nunes Duarte & Maganha Advogados,
[s. l.], p.
1-1, 25 fev. 2022. Disponível em: https://ndmadvogados.com.br/artigos/memorando-de-entendimento-mou-o-que-e-e-quando-sua-startup-deve-fazer#:~:text=O%20MoU%2C%20ou%20Memorandum%20of,ficou%20combinado%20entre%20as%20partes.
Acesso em: 25 jul. 2022.
FILHO, Alexandre Assf. O Memorando de
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2021. Disponível em: https://www.revide.com.br/blog/alexandre-assaf-filho/o-memorando-de-entendimentos-mou-e-sua-importancia/#:~:text=Os%20irm%C3%A3os%20Winklevoss%20decidiram%20processar,programa%C3%A7%C3%A3o%20do%20projeto%20%5B1%5D.
Acesso em: 28 jul. 2022.
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PUGA, Bruna Santana. Memorando de
Entendimentos: segurança estratégica para operações e negociações empresariais. BP ADVOGADOS, [S. l.], p. 1-1, 2 mar.
2022. Disponível em: https://www.brunapuga.adv.br/post/seguranca-estrategica-para-operacoes-e-negociacoes-empresariais.
Acesso em: 25 jul. 2022.
Autora:
Marilza
Tânia Ponte Muniz Feitosa é advogada inscrita na Ordem dos Advogados do
Brasil, pós-graduanda em Direito Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas,
presidente da Comissão de Direito Empresarial da OAB Subsecção Sobral e
profissional de Compliance Anticorrupção CPC pela LEC e FGV.
Fonte: Revista Consultor Jurídico