Empresas matrizes que se deparam
diariamente com cobranças de débitos tributários de suas filiais também
questionam se podem compensar créditos tributários entre elas. Esses assuntos
resultaram em posicionamentos diversos nos Tribunais Regionais Federais e nos
Tribunais Superiores.
O conceito de empresa é extraído do artigo 966 do Código Civil [CC]: "quem
exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a
circulação de bens ou de serviços". Assim, o desempenho de uma
atividade econômica visa à obtenção de lucro.
Em regra, espera-se que uma sociedade empresária, em meio à sua atuação, seja
onerada por diversas responsabilidades, como: pagamento de funcionários, compra
de insumos, recolhimento de tributos, bem como o cumprimento de sua atividade
fim.
Todavia, ocorre que, às vezes, as empresas não conseguem adimplir com suas
obrigações. E, quando o inadimplemento é de sua filial, suas respectivas
matrizes acabam, também, por se tornar alvos de cobranças judiciais.
Feitas essas considerações, passa-se a trazer breve conceito do que é uma
empresa matriz e uma filial. Uma empresa matriz é considerada um
estabelecimento principal, enquanto sua filial, sob uma ótica hierárquica e
organizacional da empresa, é tida como uma ramificação da matriz - um
estabelecimento subordinado -, porém com certa autonomia decisória [1].
A autonomia da filial é delimitada ao âmbito administrativo e operacional para
fins fiscalizatórios, porém, essa autonomia, não se estende à autonomia
jurídica, conforme fixado pelo do Superior Tribunal de Justiça [STJ] [2]:
"3.O fato de as filiais possuírem CNPJ próprio confere a elas somente
autonomia administrativa e operacional para fins fiscalizatórios, não abarcando
a autonomia jurídica, já que existe a relação de dependência entre o CNPJ das
filiais e o da matriz."
Sob a ótica tributária, é necessário destacar o princípio da autonomia dos
estabelecimentos, a fim de se verificar as obrigações e as responsabilidades da
empresa filial perante a Fazenda Pública. Esse princípio preceitua que os
estabelecimentos empresariais devem ser considerados como unidade autônoma e
independente nas relações jurídico-tributárias perante a Fazenda Pública, como
bem explicado pelo ministro Mauro Campbell Marques:
"[...]O princípio tributário da autonomia dos estabelecimentos, cujo
conteúdo normativo preceitua que estes devem ser considerados, na forma da
legislação específica de cada tributo, unidades autônomas e independentes nas
relações jurídico-tributárias travadas com a Administração Fiscal, é um
instituto de direito material, ligado à questão do nascimento da obrigação tributária
de cada imposto especificamente considerado e não tem relação com a
responsabilidade patrimonial dos devedores prevista em um regramento de direito
processual, ou com os limites da responsabilidade dos bens da empresa e dos
sócios definidos no direito empresarial.[...] [3]."
Todavia, não se deve confundir o princípio da autonomia tributária dos
estabelecimentos com a não responsabilização da matriz por inadimplementos
tributários de sua filial. Conforme exposto, a filial não possui autonomia
jurídica nem patrimonial.
Nesse sentido, o STJ passou a considerar que a matriz responde pelo débito
tributário da sociedade empresária como um todo, mesmo que o tributo seja
decorrente de fato gerador imputável apenas a uma das empresas:
[4]."[...] Apesar do princípio da autonomia dos
estabelecimentos, filial e matriz respondem com o seu patrimônio pelo débito
tributário da sociedade empresária, ainda que relativo a tributo decorrente de
fato gerador imputável apenas a uma delas [...]"
Porém, posto que as filiais não gozam de autonomia jurídica, também passou a
ser considerado que a matriz pode pleitear a restituição ou compensação dos
valores pagos a maior por suas filiais. Nesse sentido, o STJ formou o seguinte
o entendimento [5]:
"4.Os valores a receber provenientes de pagamentos indevidos a título de
tributos pertencem à sociedade como um todo, de modo que a matriz pode pleitear
restituição ou compensação tributária relativamente a indébitos de suas
filiais."
Corroborando com ambos os entendimentos, foi publicado o Informativo de
Jurisprudência do STJ nº 700, de 14 de junho de 2021, que apresenta os
seguintes pontos:
"A sucursal, a filial e a agência não têm um registro próprio, autônomo,
pois a pessoa jurídica como um todo é que possui personalidade, sendo ela
sujeito de direitos e obrigações, assumindo com todo o seu patrimônio a correspondente
responsabilidade.
As filiais são estabelecimentos secundários
da mesma pessoa jurídica, desprovidas de personalidade jurídica e patrimônio
próprio, apesar de poderem possuir domicílios em lugares diferentes
(artigo 75, §1º, do CC) e inscrições distintas no CNPJ.
O fato de as filiais possuírem CNPJ próprio
confere a elas somente autonomia administrativa e operacional para fins
fiscalizatórios, não abarcando a autonomia jurídica, já que existe a relação de
dependência entre o CNPJ das filiais e o da matriz.
Os valores a receber provenientes de
pagamentos indevidos a título de tributos pertencem à sociedade como um todo,
de modo que a matriz pode discutir relação jurídico-tributária, pleitear
restituição ou compensação relativamente a indébitos de suas filiais."
Conclui-se, portanto, que se deve considerar que as filiais possuem obrigações
pessoais com o Fisco, conforme o princípio da autonomia dos estabelecimentos.
Porém, em caso de inadimplemento de suas obrigações, o estabelecimento matriz
pode ser responsabilizado por débitos de sua filial.
[1] Ricardo Negrão apud James Eduardo Oliveira, Código Civil anotado E
COMENTADO, 2ª ed., Forense, p. 864-865.
[2] AgInt no AREsp nº 731.625/RJ.
[3] REsp: 1355812 RS 2012/0249096-3.
[4] AgInt nos EDcl no AREsp nº 1.612.356/MS.
[5] AgInt no AREsp nº 731.625/RJ.
Autor:
Dante Filipe Pucci Prunk é
pós-graduado em Direito Público pela e em Direito Administrativo pela Unyleya
Faculdade Unyleya e cursando MBA em Gestão Tributária pela Escola Superior de
Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo (Esalq/USP).
Fonte: Revista Consultor Jurídico