O assédio moral se
caracteriza pela sequência de atos de violência psicológica a qual uma pessoa é
submetida, seja pelo superior hierárquico (assédio vertical), por colegas de
trabalho (assédio horizontal) ou até mesmo por subordinados.
A partir de 20 de março de 2023, por força
da Portaria MTP 4219/2022, as organizações obrigadas a constituir CIPA nos
termos da NR 5 devem adotar as seguintes medidas, além de outras que entenderem
necessárias, com vistas à prevenção e ao combate ao assédio sexual e às demais
formas de violência no âmbito do trabalho:
1) inclusão de regras de conduta a respeito
do assédio sexual e de outras formas de violência nas normas internas da
empresa, com ampla divulgação do seu conteúdo aos empregados e às empregadas;
2) fixação de procedimentos para recebimento
e acompanhamento de denúncias, para apuração dos fatos e, quando for o caso,
para aplicação de sanções administrativas aos responsáveis diretos e indiretos
pelos atos de assédio sexual e de violência, garantido o anonimato da pessoa
denunciante, sem prejuízo dos procedimentos jurídicos cabíveis; e
3) realização, no mínimo a cada 12 (doze)
meses, de ações de capacitação, de orientação e de sensibilização dos
empregados e das empregadas de todos os níveis hierárquicos da empresa sobre
temas relacionados à violência, ao assédio, à igualdade e à diversidade no
âmbito do trabalho, em formatos acessíveis, apropriados e que apresentem máxima
efetividade de tais ações.
É comum ouvir pessoas comentarem que muitas
empresas agem de má-fé na medida em que assediam seus empregados, expondo-os ao
ridículo perante os colegas ou superiores, humilhando-os, ameaçando-os das mais
diversas maneiras, ou seja, cometendo atos que configuram o dano moral,
violando assim a norma trabalhista e a própria Constituição Federal.
Por cometer tais violações e uma vez
comprovadas através de provas robustas, as empresas acabam sofrendo as
consequências e penalidades quando acionadas perante a Justiça do Trabalho.
No entanto, sob a ótica do que se pretende
alertar neste artigo, há que se considerar que a empresa (pessoa jurídica) age,
no campo subjetivo, por meio de seus prepostos (Diretores, Gerentes, Chefes,
Encarregados), os quais externam ou deveriam externar, através de suas ações, a
vontade da organização.
A empresa não é um ser orgânico, não possui
sensibilidade, não externa pensamentos ou sentimentos. Sua vontade normalmente
está consubstanciada em documentos, tais como procedimentos internos, visão,
missão, valores, enfim, normas que buscam orientar e direcionar as ações de
seus empregados e prepostos.
Por mais que os empregados tenham
conhecimento e orientação em seguir o que ali está determinado, sob pena de
sofrerem as sanções previstas internamente, bem como as estabelecidas em lei,
não são raras as ocasiões em que as atitudes de seus prepostos confrontam
diretamente à vontade da própria empresa.
Considerando que a empresa é responsável
por eleger seus prepostos, os quais irão fazer valer suas normas através de
seus atos, consequentemente também será responsável pelas ações e omissões
destes prepostos, podendo, inclusive, ser condenada a indenizar eventuais
prejuízos provocados aos empregados ou a terceiros.
Por óbvio, posto o que já foi mencionado, a
empresa (pessoa jurídica) não é capaz de cometer assédio moral para
com seus empregados, mas as pessoas responsáveis pela direção da empresa
(prepostos) é que são dotadas de vontade própria, podendo cometer assédio moral
de acordo com suas conveniências, ainda que tais atitudes estejam violando os
procedimentos internos, a legislação trabalhista ou a Constituição.
O poder atribuído à
empresa de disciplinar a conduta do empregado é transferido ao preposto
(gestor). Se no uso deste poder o preposto comete assédio moral, a empresa não
será eximida de indenizar o empregado ofendido, já que a Justiça do Trabalho
entende que se a empresa tem o poder de eleger o preposto para representá-la,
deve assumir também esse risco, a chamada culpa in eligendo (culpa
pela má escolha de seu representante).
Se as normas da empresa são claras neste
sentido, ou seja, se o empregado é comunicado formalmente sobre a obrigação
ética (no relacionamento pessoal e profissional) para com os colegas,
subordinados ou superiores hierárquicos, os atos praticados pelos prepostos que
violarem estas normas, poderão ser revertidos em penalidades (advertência ou suspensão
disciplinar, demissão por justa causa ou pagamento de indenizações)
em desfavor dos mesmos.
O que se percebe na
prática é que o preposto (de posse de seu cargo) passa a atuar,
equivocadamente, de uma forma como se nada pudesse atingi-lo, e que as normas
da empresa só valem aos subordinados.
Assim, muitos prepostos cometem assédio das
mais variadas formas, os assediados recorrem à justiça, ganham indenização
(paga pela empresa) e o preposto sequer é advertido verbalmente sobre seu ato.
Cabe ressaltar que se tais fatos são de conhecimento da empresa e esta nada faz
para eliminar, conclui-se que tudo pode estar ocorrendo por conivência ou até
mesmo por orientação do empregador.
Portanto, se não há procedimentos internos
ou um código de ética/conduta que delimitam estas atitudes por parte de seus
representantes, passou o momento de rever estes procedimentos, de maneira a
estabelecer limites e indicar as penalidades para cada situação e comunicar
(formalmente) cada empregado, na forma de um aditivo contratual, fazendo lei
entre as partes.
A intenção nessa mudança de comportamento
por parte do empregador é atribuir responsabilidades a este preposto (considerando
a lei entre as partes) com base no seu poder de mando, bem como apontar que seu
ato, se contrário às normas internas ou à lei, será punido na devida proporção,
de modo a inibir ou evitar tais atitudes.
Se determinado gestor, recém contratado,
está acostumado a assediar seus subordinados por ser "cultura" na
antiga empresa, caso não seja informado das normas de conduta no ato da admissão,
esta prática continuará acontecendo, talvez de forma mais branda num primeiro
momento, mas gradativamente se acentuando ao longo do tempo.
Conscientizando o preposto de que certas
atitudes (consideradas como assédio moral) podem trazer condenações à empresa
no pagamento de indenizações trabalhistas, e que estas indenizações podem ser
revertidas em prejuízo próprio (financeiros ou do próprio emprego), é certo que
os atos serão reduzidos ou abolidos ao longo do tempo.
Nos julgamentos de assédio
moral há dois aspectos que são considerados essenciais:
Regularidade dos
ataques (os fatos se repetem ao longo do tempo), e;
Desestabilização
emocional da vítima (podendo ocorrer a determinação de afastar a vítima do
trabalho pelo abalo emocional).
Dentre os vários
atos cometidos pelo empregador (preposto) que podem caracterizar o assédio
moral podemos citar:
Inação compulsória
(quando o empregador se recusa a repassar serviço ao empregado, deixando-o
propositalmente ocioso);
Atribuir tarefas
estranhas ou incompatíveis com o cargo, ou estabelecendo prazos inatingíveis;
Expor ao ridículo
(quando o empregado é exposto a situações constrangedoras frente aos demais
colegas de trabalho ou clientes por não atingir metas);
Humilhações verbais
por parte do empregador (inclusive com palavras de baixo calão);
Atribuir tarefas
simples ou básicas a empregados especializados;
Coações psicológicas
(fazer o empregado afastar-se do trabalho ou a aderir a programas de demissão
voluntária);
Reter informações
importantes que afetam o desempenho do trabalho do empregado;
Desprezar os
esforços e os resultados atingidos pelo empregado;
Ocultar ou
apropriar-se de ideias, sugestões ou projetos com o intuito de prejudicar o
empregado, entre outros.
Em inúmeros julgados
trabalhistas são demonstradas situações
absurdas de assédio que parece não fazer parte de nosso dia a dia, mas são
realidades que as empresas (seus gestores) ainda permitem que aconteçam, seja por
descaso, negligência ou despreparo para gerenciar pessoas, colocando em risco a
"vida da empresa", por perder bons profissionais que não se submetem
a tais comportamentos.
Entretanto, o
assédio moral deve ser comprovado pela parte que alega, e para sua
caracterização é necessária a existência de danos causados à imagem, honra ou
integridade moral e física ocorridas ao longo do contrato de trabalho.
Autor: Sergio
Ferreira Pantaleão é Advogado, Administrador, responsável técnico pelo Guia
Trabalhista e autor de obras nas áreas Trabalhista e Previdenciária.