Os estudos
continuados, sobre as situações vinculadas às provas a favor ou contra a
existência de lucros cessantes e a sua valorimetria, geram perspectivas de
grande magnitude para os peritos, árbitros, juízes e advogados, e na ambiência
das pesquisas realizadas no nosso laboratório de perícia forense-arbitral,
surgiu a oportunidade de apresentar uma reflexão em relação a esta importante
tema, "prova contábil", como segue.
Os registros
contábeis fazem prova a favor ou contra o seu titular, especificamente quanto à
hipótese da prova é a existência ou não de lucros cessantes, o entendimento do
Laboratório de Perícia Forense-arbitral Zappa Hoog & Petrenco, é no sentido
de não precificar a indenização por lucros cessantes sem comprovação
contábil hábil da sua existência de forma razoável, por
conseguinte, deve ser rejeitado as miragens de lucros hipotéticos,
remotos ou imaginários, incluídos nessa categoria aqueles lucros que
supostamente seriam gerados pela rentabilidade de atividade, cuja probabilidade
e proporcionalidade a receita, não foi comprovada com uma asseguração
contábil. Até porque, meras conjecturas sobre o futuro, não são elementos
contábeis probatórios.
Com especial destaque surgem os registros
contábeis maquiados, os quais configuram a abominável figura da torpeza[1], que não pode, em nenhuma
hipótese, ser alegado ou aproveitado por quem tenha dado causa a ele, pois quem
apresenta na fase instrutória probante, ou seja, nos autos de um processo, um
balanço de resultado econômico desfavorável por maquiagem ou evasão tributária,
não pode alegar erro, como, por exemplo: omissões ou inclusões de dados, como a
falta de registros de receitas, ou inclusão de despesas/custos impróprios, para
justificar o pedido de indenização de lucros cessantes afastando a prova que
fez contra si mesmo. Sem embargos ao fato de que quem apresentou na instrução
processual, um balanço maquiado não pode dele se beneficiar, por ser isto uma
questão pacificada, já que a ordem jurídica não chancela exercício jurídico
inadmissível (art. 187 do CC/2002), o que significa a obrigação da adoção de
comportamento lastreado na boa-fé e na ética; temos o direito do outro
litigante que pode arguir a falsidade deste balanço de resultado econômico, nos
termos dos art. 430 e seguintes do CPC/2015.
O ônus da prova da
existência de lucros cessantes é de quem afirma o fato, pois trata-se de um
acontecimento constitutivo do direito pleiteado. A ausência contábil da
comprovação dos lucros cessantes, representa um fator extintivo do direito de
quem pleiteia a indenização, por isso, é importante um suporte de um perito contador especializado
no tema antes da propositura da ação para fazer um parecer e avaliar o corpo de
provas existente.
Em caso de implantação de um novo negócio,
ou uma startup, situação
em que não existem registros contábeis anteriores ao evento, portanto, se
utiliza um estudo de viabilidade econômico-financeira para a valorimetria do
lucro cessante, ou eventual avaliação comparativa por múltiplo[2], desde que este estudo de viabilidade seja factível em
função dos princípios da epiqueia contabilística, da razoabilidade, da
proporcionalidade e da probabilidade. Vale lembrar que a ausência de
registros contábeis, onde se pode aplicar critérios de arbitramento do lucro em
função do RIR/2018, embora válido, útil e factível por ser uma presunção legal,
é algo totalmente distinto de uma contabilidade onde se faz prova substancial
contra ou a favor de quem pleiteia a indenização por lucro cessante.
É fato axiomático
que um parecer de precificação de lucros cessantes, para embasar a inicial ou a
contestação, nos termos do art. 472 do CPC/2015, faz a diferença, pois é um
documento elucidativo prévio. Não se trata de uma etapa obrigatória, é
facultativa, é será executado como uma melhor estratégia jurídica técnica que
faz toda a diferença, quando se pretende obter justiça e evitar ou minimizar
riscos de honorários de sucumbência.
Está pacificado pela
doutrina, ou seja, é um fato notório o entendimento de que a Justiça não
alberga dano relativo ao lucro cessante potencial, ilusório ou hipotético.
E por derradeiro, a leitura de uma boa
doutrina específica e clássica em relação ao tema, faz toda a diferença na
valorimetria de uma justa indenização. Indicamos o nosso livro: HOOG, Wilson A.
Z. Perdas, Danos e Lucros Cessantes
em Perícias Judiciais. 7. ed. Curitiba: Juruá 2021, o qual está
sendo utilizado nos Programas de Educação Continuada do Sistema CFC/RC's.
[1] TORPEZA -
um ato torpe, pelo viés da ciência da contabilidade e jurídica, é um negócio
viciado por fraude, desonesto e que se afasta da razoabilidade e da boa-fé. A
boa-fé no mundo dos negócios é algo comutativo, pois trata-se de uma obrigação
recíproca a que se obrigam todos de forma equivalente. E a torpeza não
pode ser alegada ou aproveitada por quem tenha dado causa a ela. E em situações
que envolvam processos judiciais ou arbitrais, quem deu causa à torpeza poderá
ser condenado à litigância de má-fé. Portanto, um ato torpe é aquele praticado
em sentido contrário à lei, à revelação da verdade real, à ética e à função
social da propriedade. Ao agir com torpeza, a pessoa tem, ou deveria ter,
conhecimento do mal que pode causar a outrem. Agindo assim, com desonestidade,
fere os princípios da boa-fé, da probidade, que regem os negócios jurídicos.
Não se admite em um Estado Democrático de Direito, a penalização de uma pessoa
sem se comprovar a conduta torpe, o nexo de causalidade, e o resultado
pretendido. É fato incontrovertido que a ordem jurídica não chancela
exercício jurídico inadmissível (art. 187 do CC/2002), o que significa a
obrigação da adoção de comportamento ético das partes de uma relação
contratual, negócio jurídico, pontualmente no exercício de direitos, o
parâmetro do princípio da boa-fé, o que veda o abuso de direito ou de poder,
pois em todos os negócios jurídicos busca-se uma conduta baseada na confiança,
na função social, na dignidade, na lealdade e com a intenção à boa-fé,
confiança e informação correta, sem a abominável onerosidade excessiva para uma
das partes em detrimento da outra. Aplicando-se nas relações jurídicas o
princípio do venire
contra factum proprium, princípio que veda o comportamento
contraditório e imprevisto que pode causar surpresa na outra parte, portanto,
temos o axioma de que "ninguém pode comportar-se contra seus próprios atos".
Por exemplo, um aumento ou diminuição da receita, pela via da violação da
norma que disciplina a demonstração do resultado de um exercício, não pode ser
usada posteriormente por quem busca se beneficiar da própria torpeza, neste
exemplo, envolvendo a Demonstração do Resultado do Exercício (DRE) para a
precificação de lucros cessantes, temos a situação de abuso verificado quando
uma pessoa viola uma norma jurídica e, posteriormente, tenta tirar proveito
desta violação em uma demanda judicial ou arbitral, porquanto, o dever de
probidade deve ser observado em todas as fases, seja anterior ou posterior a do
processo judicial ou arbitral. Outro exemplo, é a situação de passivo fictício
ou de caixa dois em balanços para a apuração de haveres ou deveres, pois a
sociedade que vai pagar haveres, não pode se beneficiar de balanço com passivos
fictícios ou com omissão de caixa dois, pois tal fato gera enriquecimento sem
causa, ou seja, quem busca indenização por lucro cessante, não pode pedir a
inclusão de caixa dois, e quem vai pagar haveres de sócios, não pode exigir a
precificação sem o caixa dois e seu efeito em fundo de comércio. (HOOG, Wilson
A. Z. Moderno Dicionário Contábil.
12. ed., 2023 no prelo.)
[2] COMPARAÇÃO POR MÚLTIPLOS (§
4° do art. 4° da Lei 6.404/1976) - é um critério de avaliação, cujo conceito
foi desenvolvo em parceria com o Prof. Everson Luiz Breda Carlin: "A avaliação relativa (ou por
múltiplos de mercado) parte do princípio de que ativos semelhantes devem (ou
podem) ter valores semelhantes. Na avaliação relativa, busca-se determinar o
valor de ativos com base na precificação de empresas similares (ou ativos
similares) no mercado. Este método de avaliação procura avaliar a empresa por
meio da comparação com parâmetros de outras empresas similares sob a premissa
de que empresas, mercados ou ativos semelhantes devem ter valores muito
próximos. O cálculo do valor de uma empresa por este método de avaliação
relativa é também conhecido como método dos múltiplos de mercado. Esta
metodologia consiste na obtenção de valores médios de bens equivalentes
negociados no mercado e na utilização desses valores como referência ou
justificativa para os preços pedidos por outros bens para se determinar o valor
de uma empresa que consiste em encontrar outra empresa idêntica, ou pelo menos
comparável, obter seus múltiplos e aplicá-los aos parâmetros da empresa
analisada. Neste método, devem ser observados três passos essenciais da
avaliação relativa: (i) identificação de ativos comparáveis que sejam
precificados pelo mercado; (ii) classificação dos preços de mercado, em relação
a uma variável comum para gerar preços padronizados que sejam comparáveis, e
(iii) adaptação das diferenças entre os ativos, ao comparar os seus valores
padronizados." (HOOG, Wilson A. Zappa. Dicionário de Vocabulários da Lei das Sociedades Anônimas - Lei 6.404,
de 15.12.1976. Curitiba: Juruá, 2022.)
REFERÊNCIAS
HOOG, Wilson A. Z. Moderno Dicionário Contábil -
da Retaguarda à Vanguarda. - Contém os Conceitos das IFRS. Revista, Atualizada
e Ampliada. 12. ed. Curitiba: Juruá, 2023, no prelo.
______. Perdas, Danos e Lucros Cessantes em Perícias Judiciais. 7. ed. Curitiba: Juruá 2021.
______.Dicionário de Vocabulários da Lei das Sociedades Anônimas - Lei 6.404, de 15.12.1976.
Curitiba: Juruá, 2022.
BRASIL. Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002.
Institui o Código Civil.)
______. Lei 13.105, de 16 de março de 2015.
Código de Processo Civil.
Autor:
Wilson A. Zappa Hoog é sócio do Laboratório de Perícia-forense arbitral
Zappa Hoog & Petrenco, perito em contabilidade e mestre em direito,
pesquisador, autor da Teoria Pura da Contabilidade e suas teorias
auxiliares, doutrinador, epistemólogo, com 49 livros publicados, sendo
que existe livro que já atingiram a marca da 17ª edições.