A denominação de uma
"representação adequada e consequentemente a fidelidade", do conjunto das
demonstrações financeiras, representa uma garantia ao utentes dos
relatórios contábeis, em especial os investidores, os credores, os empregados e
demais interessados, pois é deveras importante que as demonstrações financeiras
sejam concebidas, no mínimo, na forma de "representação adequada", pois
as abomináveis maquiagens de balanços configuram uma epidemia criativa que
desestabilizam o mercado financeiro é a credibilidade dos contadores e
auditores.
Os acionistas e administradores precisam
prestigiar e respeitar os princípios da boa-fé, diligência e probidade,
lembrando que urge aos contadores, fiscais e auditores a necessidade de
bradarem pela primazia de sua independência científica e ética, não se
sujeitando a interesse difusos e profanos de gestões temerárias das
células sociais de direito privado ou público, o risco de maquiagem não está
somente na contabilidade das pessoas jurídicas de direito privado, pois existe
nos registros efetuados pela pessoas jurídicas de direito público. As
informação contidas no conjuntos das demonstrações financeiras devem
representar adequadamente a situação econômica e financeira das transações e
outros eventos patrimonais. Não estamos dizendo que o labor dos contadores,
fiscais e auditores não estão sujeitos à risco, pois é inerente as suas funções
a exposição de riscos de indução à erro, os quais não podem ser totalmente
eliminados, mas podem ser reduzidos a partir da aplicação do ceticismo na
busca de uma asseguração no mínimo razoável. Inclusive o fato de um
balanço ter sido auditado por uma das firmas de auditoria
consideradas como sendo integrante das big four, não significa que existe um melhor serviço
ou uma segurança incondicional, em relação aos serviços das firmas
brasileiras de auditoria, até porque, as firmas de auditorias
brasileiras, por contribuições dos seus sócios, da CVM e do CFC, atendem aos
padrões internacionais, sendo que o programa de revisão externa pelos pares[1] e o vinculado à educação
continuada, aumentaram a confiabilidade das firmas brasileiras, tomando a
credibilidade, quiçá, superior aos das multinacionais big four.
A expressão "representação adequada", consiste em um dos requisitos
axiomáticos para que ocorra a fidelidade do conjunto das demonstrações
financeiras, as quais, devem ser elaboradas sob o escudo da Teoria Pura da
Contabilidade[2] e suas dez teorias auxiliares, como a da
essência sobre a forma,[3] que
objetivam fornecer informações que sejam fidedignas para as tomadas de decisões
e avaliações por parte dos utentes.
As demonstrações
contábeis quando preparadas com tal finalidade, a representação adequada da
situação patrimonial, o que implica na fidelidade, atendem os pressupostos
fundamentais da Teoria Contábil, valorizam os profissionais da ciência da
contabilidade, e satisfazem as necessidades básicas das seus usuários, tais
como:
· Interpretar o
conjunto de atos[4] e fatos[5] patrimonais escriturados em
simetria ao regime de competência;
· Saber o real valor
dos ativos, neles incluído o fundo do comércio;
· Saber o real valor
dos passivos, neles incluindo todas as contingências;
· Conhecer a
verdadeira situação econômica e financeira;
· Deliberar sobre o
momento adequado para comprar, manter ou vender participações acionárias;
· Avaliar o desempenho
da gestores e as suas prestações de contas;
· Saber sobre os
riscos de fraudes contra credores, e a capacidade da célula social de pagar
seus empregados, e fornecedores, entre outros credores;
· Saber sobre a
segurança quanto à recuperação e a remuneração dos recursos financeiros
empregados;
· Dar suporte ao
desenvolvimento de políticas públicas voltadas à produção, geração de
empregos, distribuição de rendas, comercialização e desenvolvimento sustentável
ético do país;
· Informações precisas
nas notas explicativas, tais como, quadros suplementares e detalhes analíticos
dos negócios, e riscos e incerteza gerais sobre o segmento em geral no Brasil,
e específico da célula social, as notas explicativas não podem se limitar a
apenas as constatações dos fatos, mas também, devem conter informações e
explicações detalhadas dos fatos e técnicas aplicadas, da política corporativa
e dos atos patrimoniais.
· Entre outros
benefícios possíveis pelo não risco geral de interpretações de um conjunto de
relatórios falaciosos.
É imperioso registramos nesta reflexão que a violação da regra pétrea da
representação adequada, implica necessariamente na violação da fidelidade das
demonstrações financeiras. Cabe enfatizar que no âmbito da credibilidade do
labor dos contadores, fiscais e auditores, a representação adequada representa
um marco conceptual doutrinário, já que o labor dos contadores gera informações
úteis aos utentes e fundamentais para a convicção dos intérpretes, e esta nossa
proposta de diálogo e reflexão entre a literatura, os contadores, os
investidores, os fiscais, os peritos, e os auditores, contribui para a
eliminação de ficções, falácias e maquiagens dos balanços, sejam eles
patrimonais ou de resultado econômico. A Teoria da Essência sobre a Forma,
pontualmente pelo seu princípio da impessoalidade[6] impede a adoção de comportamentos de
favoritismo e serve para orientar a correta interpretação dos atos, fatos e
procedimentos de valorimetria. À título de exemplos, sem encerrar a lista
de incongruências que geram efeitos adversos, podemos citar casos que
levam à falta de credibilidade em decorrência da não representação adequada: a
falta do reconhecimento do principal ativo, o fundo de comércio
internamente desenvolvido; a ocultação dos riscos sacados[7]; o registro indevido de gastos como despesas
quando deveriam ser contabilizados como, ativo, direitos da pessoa
jurídica de receber de seus administradores os fatos ligados à violação da
Teoria Ultra
Vires[8], o não reconhecimento de contingências
passivas[9], despesas fictícias, omissões de receitas e
evasões de tributos.
[1] A Revisão externa pelos pares, labor deveras importante, constitui-se
em processo de acompanhamento e controle de qualidade dos trabalhos realizados
pelos auditores independentes, estamos falando que no Brasil existe uma
avaliação externa dos procedimentos de auditoria aplicado pelas firmas.
[2] A Teoria Pura da Contabilidade, como obra primeira e fundamental para
um Programa de Educação Continuada, possui a sua fundamentação na seguinte
literatura: HOOG, Wilson A. Zappa. Teoria Pura da
Contabilidade. Ciência e Filosofia. 5. ed. Curitiba:
Juruá, 2022.
[3] A Teoria da Essência sobre a Forma possui a sua fundamentação na
literatura: HOOG, Wilson A. Zappa. Teoria Pura da Contabilidade.
Ciência e Filosofia. 5. ed. Curitiba: Juruá, 2022.
[4] ATO CONTÁBIL -
termo utilizado em contabilidade, para designar uma ação administrativa, e que
equivale a um ato administrativo, ou seja, ato que ainda está por suceder um
fato patrimonial, logo, é uma potencialidade de fenômeno patrimonial.
HOOG, Wilson A. Z. Moderno Dicionário Contábil.
12. ed., 2023, no prelo.
[5] FATOS PATRIMONIAIS - representa as aplicações dos
recursos de uma riqueza; toda forma de movimentação. Os fatos patrimoniais são
todas as operações que provocam alterações na composição de um patrimônio. E
dividem-se em modificativos, aumentativos e diminutivos; que são os que alteram
a patrimônio líquido, e os permutativos que não alteram o patrimônio líquido.
Existe ainda uma terceira categoria dos fatos, que é denominada de fato misto,
aumentativo ou diminuitivo, pois altera o patrimônio líquido como também pode
permutar valores. Portanto, os fatos são todos os acontecimentos que ocorrem em
uma célula social, passíveis de mensuração monetária. Não se pode
confundir fato com ato, administrativo patrimonial. O ato
administrativo, não produz de imediato qualquer alteração no patrimônio,
modificativo, permutativo ou misto, e são registrados na contabilidade, no
sistema de compensação operação extrapatrimonial. A título de exemplo de um
ato, temos a nomeação ou eleição de um administrador para a execução dos atos
de gestão e dos fatos, o reconhecimento do gasto com pró-labore a este
administrador que está alterando o patrimônio líquido de uma célula social. A
geração do superlucro, é um fato patrimonial modificativo aumentativo,
considerado a causa do fundo de comércio. HOOG, Wilson A. Z. Moderno Dicionário Contábil. 12. ed., 2023 no prelo.
[6] Princípio
da impessoalidade - para a contabilidade, e no abrigo da Teoria da Essência
sobre a Forma, este princípio prega que a ciência da contabilidade não se
refere ou não se dirige a uma pessoa ou entidade em particular, mas às pessoas,
físicas e jurídicas, à coletividade em geral, independente de qualquer
circunstância ou particularidade. Logo, determina condutas obrigatórias e
impede a adoção de comportamentos de favoritismo e serve para orientar a
correta interpretação dos atos, fatos e procedimentos de valorimetria. Motivo
pelo qual temos a equanimidade ou disposição de reconhecer a equidade e a
verdade real de todos os atos e fatos contábeis envolvidos em uma relação ou
negócio patrimonial, com imparcialidade e independência. Logo, afastada toda e
qualquer influência ou interesse, evita-se o excesso por uma interpretação
extensiva, viciada ou polissêmica, para prevalecer a essência da ciência
contábil sobre a forma jurídica. HOOG, Wilson A. Z. Filosofia Aplicada à
Contabilidade. 4. ed., 2023.
[7] RISCO SACADO - O
risco sacado termo usado para indicar um desconto de títulos, por uma forma de
antecipação de valores que os fornecedores, normalmente de células sociais de
grande movimentação financeira como indústrias e redes de varejo, têm a
receber. Representa uma operação de crédito do comprador, utilizado como uma
modalidade de antecipação de recebíveis para o vendedor. A luz da teoria
da essência sobre a forma, quando uma instituição financeira antecipa o
pagamento de um fornecedor, este valor deve ser registrado no passivo bancário,
pois uma instituição de crédito passa a ser credora em substituição ao
fornecedor, portanto a operação em sua essência, configurava-se como um
empréstimo, logo era uma dívida bancária. A célula social compradora deve
reconhecer as despesas financeiras, do risco sacado, em seu resultado e não no
estoque. O risco sacado é uma maneira de se obter de recursos financeiros, ou
seja, capital de giro para financiar as compras de estoque. O pagamento da
duplicata será efetuado antecipadamente ao fornecedor, e a instituição financeira,
financiadora da operação, aplica a política de sua taxa de desconto. A luz da
teoria contábil da essência sobre a forma, a operação conhecida como "Risco
Sacado", deve resultar no desreconhecimento do contas a pagar do fornecedor e
reconhecimento de um novo passivo junto a instituição financeira, ou seja, uma
transferência de passivos para que o balanço reflita adequadamente a sua
situação financeira, eis a supremacia da essência sobre a forma. Transações de
risco sacado, devem obrigatoriamente serem divulgadas em notas explicativas às
demonstrações contábeis. Para a célula social compradora de mercadorias, é algo
tido como o reverso de desconto de duplicatas a receber, ou seja, é um desconto
de uma duplicata a pagar por antecipação do seu pagamento. Portanto, é
imperioso que uma célula social reconheça expressamente que as suas normas
contábeis devem ser subordinadas aos princípios da representação verdadeira e
apropriada e da primazia da essência sobre a forma, para se evitar erros de
distorção relevante da realidade econômica que ocorrem em função de não se
reconhecer apropriadamente um Passivo "Empréstimos" e a Despesa Financeira
respectiva em DRE, distorcendo a regra do regime de competência. HOOG, Wilson
A. Z. Moderno Dicionário Contábil.
12. ed., 2023, no prelo.
[8] Por força da Teoria Ultra
Vires, a pessoa jurídica não responde além dos poderes concedidos.
Os poderes são os atos regulares de gestão, sendo os sócios administradores
responsáveis pelas obrigações, resultantes dos atos praticados por excesso de
poderes ou contrários à lei. Esta teoria é muito difundida na literatura,
gozando de prestígio internacional em decorrência de sua importância, face a
necessidade de separar as responsabilidades de um administrador das de uma
sociedade.
[9] PROVISÃO PARA CONTINGÊNCIAS
PASSIVAS - o seu registro contábil está vinculada à gestão
de riscos, e no sentido estrito senso. Estas provisões remetem à situações cujo
resultado final, poderá ser favorável ou desfavorável, mas possíveis de
ocorrerem, à luz da razoabilidade, proporcionalidade e probabilidade, por mais
remotas que sejam, ou ainda que venha a depender de eventos futuros incertos,
como, por exemplo, uma decisão judicial, prática de ilegalidades que possam,
quiçá, não serem penalizadas por circunstância como a prescrição ou a falta de
diligência dos agentes fiscalizadores. Como exemplos amplos de provisões para
contingências passivas, sem que com isto, estejamos esgotando as hipóteses,
temos:
1.
Para
rescisões de contratos de distribuição;
2.
Para
danos ou violações do direito dos consumidores;
3.
Decorrente
de multas pela não observação de procedimento de segurança dos empregados;
4.
Decorrente
de garantias de produtos e mercadorias;
5.
Para
reparar danos ambientais;
6.
Para
demandas trabalhistas;
7.
As
tributárias decorrentes de evasão;
8.
As
de logística reserva de resíduos sólidos;
9.
As
vinculadas a litígios no âmbito da justiça estatal ou no âmbito da justiça
privada, juízo arbitral.
As provisões e contingências em função de
abuso de direito ou de poder dos administradores e dos sócios/acionistas
controladores, por infração à lei ou ao estatuto/contrato social, devem
ser constituídas e evidenciadas no balanço patrimonial, mas por força da
teoria ultra vires,
não constituem despesas ou perdas, e sim, um direito, ativo, da pessoa jurídica
de receber dos gestores, os valores necessários ao retorno da situação
patrimonial existente antes destes atos culposos que geraram danos, arts.
1.011 e 1.016 do CC/2002 e arts. 154 e 158 da Lei 6.404/1976. A
responsabilidade da pessoa jurídica, está prevista de forma clara no art. 47 do
CC/2002, o que corrobora, com o fato de que, atos vinculados à desvio de
finalidade, não devem ser suportados pela pessoa jurídica, e sim, pelo
administrador. Lembramos que o registro de uma provisão para contingências,
tendo como contrapartida, o registro no ativo, relativo ao direito da pessoa
jurídica de ser ressarcida por atos de desvio de finalidade do gestor, não
altera o patrimônio líquido, e nem o lucro ou prejuízo líquido do exercício,
mas cria confiabilidade no conselho fiscal e no serviço da auditoria externa,
além de se prestigiar a correta informação aos utentes dos relatos contábeis.
Todas as provisões passivas assim como todas as provisões para contingências
passivas, devem ser necessariamente demonstradas nas notas explicativas, para
que, estes atos e fatos, fiquem disponíveis para os utentes das demonstrações
financeiras, pois afetarão o resultado e o preço patrimonial das ações/quotas.
A ideia falaciosa[9] de que: para as provisões passivas
contingentes tidos como prováveis, seja realizado o provisionamento, e que para
os passivos de possível exigibilidade, sejam apenas incluídos em nota
explicativa (sem provisionar) e ainda, para os passivos ditos de exigibilidade
remota, ou de apenas indícios, não se faz provisionamento e nem indicação em
nota explicativas. Fere o dever de diligência da administração, art. 156 da Lei
6.404/1976 interpretado em conjunto com os arts. 186 e 187 do CC/2002. Pois,
toda a ação ou omissão voluntária de informações patrimoniais, que implique em
dano patrimonial à terceiros, é passível de responsabilidade. Defendemos que a
análise de risco, pela classificação: remota, possível ou provável da
exigibilidade de passivos é um embasamento para as notas explicativas, em
relação ao grau de julgamento da administração da sociedade, e jamais para
justificar a sua omissão na escrituração contábil. A boa-fé dos gestores
importa numa conduta de transparência, que exprime a ideia de confiança e passa
a se projetar sobre todos os fatos e atos de gestão. A informação sobre
indícios ou evidências de passivos não deve ser apenas "escriturada", escrita
nos relatórios contábeis, ela também deve ser de forma clara para que os
usuários possam compreender toda a verdade sobre os passivos, por força da
Teoria da Essência Sobre a Forma. O dever de informar, é aquele que prestigia
toda a comunicação e registro de informações, que modificam ou possam a vir
modificar a situação econômica e/ou a financeira de uma célula social. Até
porque, sem a informação precisa, o balanço patrimonial deixa de exprimir, com
fidelidade e clareza, a situação real da empresa, art. 1.188 do CC/2002. E, os
administradores são obrigados a prestar aos sócios contas justificadas de sua
administração, o que inclui todas os riscos e contingências, art. 1.020 do
CC/2002. E no âmbito do ativo encontra-se também provisões, como as para perdas
com cambiais, com base na média dos anos anteriores; e para perdas com estoques
por perecimento que é a "perda do bem em si" e deterioração que é a
"degeneração por perda da finalidade do bem por estar fora das especificações
técnicas, ou com data de validade expirada". A omissão de registro de passivos
contingentes não é um ato temerário[9], e nem um erro de cognição, e sim, uma
gestão fraudulenta. HOOG, Wilson A. Z. Moderno
Dicionário Contábil. 12. ed., 2023 no prelo.
Autor: Wilson A.
Zappa Hoog é sócio do Laboratório de perícia forense arbitral Zappa Hoog &
Petrenco, perito em contabilidade e mestre em direito, pesquisador,
doutrinador, epistemólogo, com 48 livros publicados, sendo que alguns dos
livros já atingiram a marca de 11 e de 16 edições.
REFERÊNCIAS
HOOG, Wilson A. Zappa. Filosofia Aplicada à
Contabilidade. 4. ed., 2023.
_____. Moderno
Dicionário Contábil. 12. ed., 2023, no prelo.
_____. Teoria
Pura da Contabilidade. Ciência e Filosofia. 5. ed.
Curitiba: Juruá, 2022.