O Brasil está prestes a passar por uma
grande mudança no âmbito tributário, pois a reforma que está em tramitação
busca remodelar por completo a tributação do consumo no país.
Não bastasse isso, a tributação sobre o
patrimônio também está passando por mudanças. O que está mudando no âmbito da
tributação de herança, por exemplo, por meio de alterações no ITCMD, a
princípio parece inofensivo. Todavia não tem nada de inofensivo nas propostas e
demonstraremos o perigo que se aproxima no decorrer deste texto.
Antes disso, é bom salientar que o Brasil
possui um enorme emaranhado de normas em matéria tributária. É consenso que
temos um dos mais complexos Sistemas Tributários do mundo. Segundo o Instituto
Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT), são produzidas 2,26 normas
tributárias a cada hora útil no país, conforme pode ser conferido aqui.
Visando reduzir esta complexidade surgiu a
reforma tributária por meio da PEC 45/2019, cujo texto segue para o Senado para
análise e votação.
Se a reforma tributária for de fato
aprovada, as famílias brasileiras serão diretamente afetadas. Especialmente
aquelas que compõem organizações empresariais e/ou que tenham acumulado
patrimônio, sejam elas pequenas médias ou grandes, pois precisarão lidar com os
efeitos tributários da sucessão no âmbito do Imposto sobre Causa Mortis e
Doação (ITCMD).
É bom lembrar que a contratualização no
âmbito do Direito de Família já é uma realidade no Brasil. A extensão dos
contratos familiares tem sido ampliada e não mais se restringe somente às
relações patrimoniais.
No âmbito do Direito Sucessório, os
contratos têm a sua importância na prevenção de litígios entre herdeiros e
sucessores, o que, sem dúvida, atrai ainda mais a relevância do planejamento
sucessório nacionalmente.
As pessoas envolvidas na sucessão familiar
(planejamento sucessório) devem adequar-se à realidade patrimonial e
empresarial existentes, sendo sabedoras de que nem sempre o aspecto subjetivo
vai prevalecer. A razão é simples: as vontades dos herdeiros e sucessores podem
ser antagônicas, ou seja, um pode ter aptidão para assumir os negócios e o
outro, se o fizer, levará todos à falência.
Por outro lado, a vontade dos autores da
herança ou fundadores poderá prevalecer, existindo mecanismos jurídicos para
garantir que os líderes da família, se assim o quiserem, continuem no comando
enquanto bem entenderem. É sempre um jogo de diálogo e muito entendimento entre
os envolvidos.
Com essa pequena introdução, passamos a
apresentar o tema propriamente deste texto.
Segundo a matéria publicada pela Fundação
Dom Cabral, sob o título "Empresas Familiares São Protagonistas na
Economia", por meio da qual ela cita uma pesquisa do IBGE de meados de
2022, 65% do PIB do Brasil é originado das empresas familiares, que são
responsáveis por 75% dos empregos gerados. Significa dizer que a quase
totalidade das empresas existentes no país possuem as famílias em seus núcleos.
Esse dado importa em reconhecer que as
empresas familiares poderão sofrer maior tributação em seus processos de
sucessão, caso a reforma tributária da PEC 45/2019, já aprovada na Câmara dos
Deputados, seja de fato também aprovada pelo Senado, casa revisora que deverá
se incumbir de promulga-la.
É que a alteração do texto constitucional
torna obrigatória a progressividade das alíquotas do ITCMD, devido aos estados
nos processos de inventário e partilha e também em planejamentos sucessórios,
caso um dos instrumentos adotado seja a doação.
A norma constitucional vigente atualmente
estabelece que: "Art.
155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: I -
transmissão causa mortis e doação, de quaisquer bens ou direitos; § 1º. O
imposto previsto no inciso I: [...] IV - terá suas alíquotas máximas fixadas
pelo Senado Federal; [...]".
Tem-se no texto da norma atual, não
alterada, uma faculdade para se estabelecer a progressividade tributária a
partir da alíquota máxima fixada pelo Senado, que hoje é de 8%. Dessa forma, os
estados, em geral, regulam o ITCMD por meio de uma alíquota única
intermediária. Em São Paulo, por exemplo, a alíquota é de 4%, já em Minas
Gerais é de 5%. O Rio de Janeiro adotou a progressividade, e patrimônios
maiores são tributados com a alíquota de 8%.
O que a reforma tributária apresenta de
novo e de muito impactante para as empresas familiares é a obrigatoriedade de
adoção da alíquota progressiva por parte dos estados. Veja-se o texto proposto:
"VI - será progressivo em razão do valor da transmissão ou da doação".
Significa dizer, portanto, que os estados
serão obrigados a adotarem a progressividade tributária para o ITCMD em seus
territórios, a partir da alíquota máxima estabelecida pelo Senado.
Com isso, a tendência é que os estados
criem progressões levando em conta a alíquota máxima atual que é de 8%, como
mencionamos acima.
Não podemos deixar de mencionar que há um
projeto de resolução em tramitação no Senado, o de nº 57/2019, que prevê o
aumento da alíquota do ITCMD para 16%. O projeto ainda não foi arquivado ou
cancelado. Ele será votado em algum momento.
Diante das considerações acima, é
fundamental que os membros de famílias que possuem empresas, patrimônio,
investimentos e afins acendam um sinal de alerta e se movimentem. Porque, caso
essa reforma tributária seja aprovada e de fato entre em vigor, a sucessão no
Brasil ficará mais onerosa.
Outra informação essencial para as empresas
e famílias é que as regras novas sobre o ITCMD, se a reforma tributária de fato
for aprovada, já terão vigência imediata, podendo ser implementadas já no ano
de 2024, conforme previsão do artigo 21 da PEC 45/2019.
Assim, a reforma tributária em si não
ficará restrita apenas ao consumo propriamente dito, atingindo patrimônio,
renda e demais bens tributáveis no país, com alta propensão de provocar
modificações significativas nos ambientes familiares e sucessórios na cadeia
das empresas familiares brasileiras.
Autores:
Frederico Binato é advogado,
especialista em empresas familiares, sócio do Binato Junqueira Pestana Aguiar e
Frattini Advocacia e associado do IBDFAM.
Tancredo Aguiar é advogado,
especialista em Direito Tributário, sócio do Binato Junqueira Pestana Aguiar e
Frattini Advocacia e Associado da Associação Brasileira de Direito Tributário
(Abradt).
Fonte:
Revista Consultor Jurídico