Hodiernamente, muito se fala sobre o
instituto jurídico denominado "planejamento sucessório".
Pretende-se, com este breve ensaio, propiciar
ao leitor elementos para responder às diversas questões que se impõe: Há
segurança jurídica na realização do planejamento sucessório? O planejamento
sucessório, quando realizado, evitará conflitos entre os herdeiros? Qual a
origem, conceito e instrumentos utilizados pelo advogado famialiarista? Afinal,
a que se destina o instituto?
Preliminarmente, esclareça-se que não se
trata de instituto novo.
Não se pretende realizar grandes
digressões históricas e atemporais, mas apenas delimitar a fonte primeira
de "planejamento sucessório" encontrada na antiga Lei
Mosaica, in verbis,
"A origem dos
testamentos se perde na escuridão dos tempos. Orígenes e outros autores de
grande nota não duvidaram fazer remontar o uso dos testamentos ao tempo dos
primeiros patriarcas [...] contam que Noé, por determinação de Deus, fizera seu
testamento, no qual dividia a terra por seus três filhos, deixando o Oriente a
Sem, a África inteira a Cham, e a Europa com as ilhas e partes setentrionais da
Ásia a Japhet; e que, depois de ter regulado esta divisão, formara um escrito
(testamento), que recitara a seus filhos e selara. Quando, se sentiu próximo da
morte, chamou aos seus filhos e entregou a Sem o escrito que continha suas
últimas vontades." [1]
Mas, afinal, qual o conceito jurídico do
denominado planejamento sucessório?
Juristas de renomes, tais como Pablo Stolze
e Rodolfo Pamplona Filho conceituam o planejamento sucessório como "um conjunto de atos que visa a
operar a transferência e a manutenção organizada e estável do patrimônio do
disponente em favor dos seus sucessores" [2].
Por sua vez, a ilustre jurista
Giselda Hinorana, conceitua como "O planejamento sucessório tem
por objetivo o exercício prático de uma atividade preventiva com a adoção de
procedimentos realizados ainda em vida pelo titular da herança com vistas à
distribuição e ao destino de seus bens para após a sua morte" [3]
Ainda, os proeminentes doutrinadores e
professores Flávio Tartuce e Giselda Hironaka, com os quais tive enorme prazer
de assistir às aulas, esclarecem que "Em
suma, pode-se afirmar que o planejamento sucessório é o conjunto de atos e
negócios jurídicos efetuados por pessoas que mantêm entre si alguma relação
jurídica familiar ou sucessória, com o intuito de idealizar a divisão do
patrimônio de alguém, evitando conflitos desnecessários e procurando
concretizar a última vontade da pessoa cujos bens formam o seu
objeto" [4].
No que concerne às modalidades de planejamento
sucessório, utilizados
pelos advogados familiaristas, citamos abaixo, alguns, a saber:
1) alteração do regime de bens
do casamento ou da união estável;
2) doações - com ou reserva de usufruto
e com ou sem cláusulas de in(comunicabilidade);
3) previdências privadas, seguros de vida e
fundos de investimentos.
4) testamentos, inclusive com as
cláusulas restritivas de incomunicabilidade, impenhorabilidade e
inalienabilidade;
5) efetivação de partilhas em vida e
cessões de quotas hereditárias após o falecimento, ou renúncia;
6) contratos de compra e venda e cessão de
quotas, obviamente, dentro das dentro das possibilidades dispostas na
legislação de regência;
7) holding familiar patrimonial - é
uma estrutura jurídica criada para segurança patrimonial familiar,
transferindo à uma sociedade a gestão e o controle dos bens. Este instrumento
facilita o planejamento sucessório e fiscal, além de proporcionar mais
segurança patrimonial;
9) trust,
ainda sem previsão legal no Brasil, sendo mais utilizado em países que adotam o
modelo common law,
trazendo aos que fazem alguns problemas à ordem jurídica interna.
Com efeito, importante salientar que, de
maneira geral e abstrata, não se pode indicar ou eleger o melhor instituto de
planejamento sucessório. Isto pois, como se sabe, compete ao advogado ouvir
atentamente o seu cliente, situando-se quanto à forma de constituição familiar
e delimitação do patrimônio existente, para, ao depois, prestar uma boa
consultoria, sempre, por óbvio, imbuído de ética e em consonância com a
legislação de regência e jurisprudência dominante.
Alerte-se para o fato de que, o advogado
familiarista deve agir com muita cautela para que não traga maiores problemas
ao cliente, uma vez que orientá-lo de forma inadequada, poderá trazer inúmeros
problemas com nulidades procedimentais e fraudes à credores, restando
comprometido todo o acervo hereditário.
Dessa forma, passa-se, doravante, às
respostas aos questionamentos preambulares.
Há segurança jurídica na realização do
planejamento sucessório?
Para que haja segurança jurídica na
adoção de um ou outro instituto, deve-se atenção à alguns pontos basilares:
1) proteção da legítima, nos termos
do artigo 1.845 do Código Civil;
2) observância do artigo 426 do Código
Civil, quanto à proibição de contratos que tenham por finalidade a
"herança de vivos";
3) atenção à demais casos de nulidades,
assim como fraudes à credores;
4) Atenção à jurisprudência uníssona, em
especial, do Superior Tribunal de Justiça, assim como da legislação de
regência, na escolha de um ou outro instrumento;
Afinal, o planejamento sucessório evitará
conflitos, a
porteriori, entre os herdeiros?
Haverá a redução significativa de possíveis
conflitos. No entanto, como não se pode determinar o comportamento de um
ente familiar, mesmo aqueles por ventura instaurados, será possível,
certamente, dirimi-los com maior segurança.
Planejamento Sucessório e Holding Familiar
Patrimonial são a mesma coisa?
A bem da verdade, não são sinônimos e
pode-se dizer que o primeiro é mais abrangente que a segunda, em razão das
diversas modalidades. Registre-se, por oportuno, que quando se aborda a
temática do planejamento sucessório, alguns fazem menção à "blindagem
patrimonial", de maneira, portanto, equivocada.
Há aqueles que se utilizam da expressão
"blindagem patrimonial", que, desde já, refuta-se, eis que em nossa
ótica, não se trata de instituto jurídico. A bem da verdade, trata-se de um
termo utilizado como "marketing" em que, muitos dos casos há
menções à situações, em tese, de possíveis fraudes à credores.
À guisa da conclusão, podemos dizer que o
planejamento sucessório é, incontestavelmente, uma importantíssima medida,
ainda mais se considerarmos os elevados custos com inventários.
Nem se diga, por outro lado, que se
aprovado e sancionado for o novo texto da "Reforma Tributária", tal
como está, importará em maior ônus a realização de inventários, eis que serão
majoradas as alíquotas do ITCMD.
Por fim, nos próximos artigos, abordaremos,
de maneira pormenorizada, a essência de cada uma das formas de planejamento
sucessório, bem como as cautelas que o advogado familiarista deve ter no que
tange à escolha de uma ou mais formas de planejamento sucessório.
Autor:
Ricardo
Politano é sócio do escritório Politano Advogados Associados, especialista
em Direito de Família e Sucessões, pós-graduado em Direito Civil e Processo
Civil e membro da Comissão de Ética da OAB e da Comissão de Prerrogativas (15ª
Região).
Fonte: Revista Consultor Jurídico