Por meio de cores, fontes e formas, uma marca pode traduzir seu
propósito e garantir reconhecimento. Mas essa identidade pode se transformar ao
longo do tempo, como a da Johnson & Johnson, acompanhando a evolução do
negócio, do público e do mercado
Não se mexe em
time que está ganhando. O ditado, que muitas vezes pode nortear decisões
difíceis de negócios, nem sempre funciona para quem almeja liderar uma empresa
atual. São muitas as mudanças necessárias ao longo do tempo para fazer de uma
marca o que ela é.
Há pouco menos de dois meses, a Johnson
& Johnson anunciou que está substituindo o seu icônico logotipo, que está
em uso há 135 anos. A identidade visual que todos conhecemos - em letra cursiva
- data de 1887 e foi inspirada na assinatura de um de seus cofundadores, James
Wood Johnson.
Mas quando e por que ponderar esse tipo de mudança em uma marca que está há
mais de 130 anos no mercado?
Para Beth Furtado, professora de comunicação da ESPM e consultora de projetos
de marketing para varejo da DeCO, essa é uma mudança que nunca deve ser
motivada por questões estéticas.
O momento adequado, segundo a especialista, é quando a empresa quer se
reposicionar ou mostrar que está se modernizando - e esse movimento pode ser
muito importante e útil para mudar a cara de uma marca.
Se for uma mudança extremamente radical, há um risco, mas a ideia é que seja
uma mudança consciente, e que dentro de um bom planejamento reflita suavidade e
o novo posicionamento da empresa.
EFEITO PANDEMIA E UMA NOVA GERAÇÃO
Beth recorda que a pandemia gerou um certo desconforto em muitas empresas, já
que a dinâmica da sociedade mudou. Nesse período de isolamento, os consumidores
passaram a reconhecer outros valores nas marcas e isso talvez tenha feito com
que muitas delas tenham revisto o seu posicionamento.
Há também quem aposte em novidades para datas comemorativas importantes, como
um centenário de sua fundação. Nesse caso, há uma oportunidade para inserir
novos elementos à marca simbolizando o início de um novo ciclo ou reforçar que
a tradição da marca segue presente, mas sempre antenada com
o presente e o futuro - trazendo valores que hoje estão mais em evidência, como
a diversidade,
sustentabilidade e ESG.
Nesse contexto de mudança, Beth faz um alerta. "O importante é trazer uma
atualização. Em 2030, a geração Z, que hoje tem entre 18 e 28 anos, será a
liderança global e um grande grupo de consumo e terá valores diferentes dos das
gerações atuais", diz.
A especialista recorda que na década de 1970, os logos eram em caixa alta, pois
vivia-se em uma sociedade formal e imperativa, e essa postura trazia certa
imponência. Hoje, muitos traduzem qualquer palavra em caixa alta como um
discurso grosseiro, em tom de comando e grito. E desde então, muitas marcas
diminuíram suas fontes e até mesmo a letra inicial da marca.
A Fisher-Price ganhou uma nova identidade visual, com
mudanças na tipografia do logo e busca um retorno a um senso lúdico de diversão
e alegria
Embora algumas marcas estejam optando por visuais mais limpos, planos e
simplificados, que muitas vezes funcionam melhor em celulares e feeds de mídia
social, esse redesenho precisa estar alinhado aos valores e ao momento da
empresa.
Outro direcionamento, outra visão de marca, novas categorias de produto,
uma oferta ampliada ao consumidor são alguns dos exemplos mais comuns dentro
das empresas, uma vez que os negócios tendem a crescer.
Por isso, é comum que a identidade mude ao longo dos anos, acompanhando
transformações internas e externas da organização. Na opinião de Beth, algumas
perguntas podem ajudar a identificar quando uma marca precisa dessa
transformação.
Pensar se o visual da marca representa o momento que ela está vivendo;
se a identidade se conecta e representa a persona da marca; e se houve mudança
de propósito são respostas que indicam a necessidade de reformular essa
expressão visual.
"Marcas são como pessoas. Quando cortamos o cabelo ou mudamos o
estilo de roupa? Quando aquilo não reflete mais quem somos e algo muda dentro
de nós", diz.
Além disso, a especialista detalha que para ter marcas fortes as
empresas precisam definir características que as diferenciem dos concorrentes
e, portanto, pensar em elementos gráficos é tão importante - e repensar também.
A logomarca e a tipografia são dois elementos complementares na
identidade visual da empresa, responsáveis por representar a personalidade da
marca. O objetivo da logo é promover a fácil identificação da marca pelos
consumidores, além de ser atrativa para o público. Nike e McDonald's são
exemplos de logos reconhecidos em qualquer lugar.
A ideia é estabelecer desde o início uma identidade que acompanhe também
a evolução da empresa, mostrando inovação diante dos desafios do mercado e das
novas expectativas dos consumidores. Por isso, às vezes, torna-se necessária
uma reformulação desses elementos visuais da marca.
No caso da Johnson, parte da infância de diversas gerações está
intimamente associada no imaginário coletivo ao reconfortante "cheirinho de
bebê". Entretanto, ao longo dos anos, a marca passou a ocupar outros lugares em
nossas casas. E então, daqui para frente, passaremos a ver seu nome escrito em
uma fonte modernizada, já que a empresa também se concentra em dispositivos
médicos e medicamentos.
A nova identidade da Johnson quer destacar
o legado da empresa, ao mesmo tempo em que moderniza elementos-chave para
demonstrar a inovação em saúde
Para alguns, aquele formato não combinava
em nada com essa oferta ampliada e alguns fatores de identidade visual são
importantes para garantir uma expressão alinhada aos valores e ao momento da
empresa.
No meio do caminho, algumas razões podem
justificar certa reformulação da marca, como mudança no posicionamento ou
expansão da marca. A Starbucks é um exemplo. Antes, a empresa usava "Coffee" em
seu logotipo. Para não se limitar na oferta, nem gerar mal-entendidos, a marca
foi reformulada, assim como sua identidade visual, que passou a contar com
novas cores e tipografia.
O logotipo da Starbucks é um dos mais reconhecidos no mundo inteiro
Outro lembrete da especialista é que assim como o posicionamento para o
mercado precisa ser repensado após uma fusão, a identidade visual também deve
ser reavaliada. Nesse caso, é importante trabalhar elementos visuais que se
relacionem com as empresas originais, como as cores e a tipografia, gerando
familiaridade entre o novo e o velho.
Por fim, há um outro problema, normalmente muito comum entre pequenos
empresários - uma identidade visual amadora. É natural que na fase inicial de
seus negócios muitos acabem criando uma identidade visual caseira e até feita
por conta própria ou com a ajuda de terceiros não especializados. Entretanto,
esse quebra-galho inicial pode gerar problemas futuros.
"Por medo de errar é muito comum os pequenos copiarem os grandes e
isso raramente vai dar certo porque perde-se a oportunidade de se criar algo
novo. Redes grandes têm muito investimento e muitas frentes trabalhando por
aquilo que, de certa forma, vai funcionar somente para eles", diz.
Fonte:
Diário do Comércio