No Direito Civil, o instituto da sucessão,
em sentido amplo, diz respeito à transmissão de uma situação jurídica de um
indivíduo para outro, seja inter vivos (entre vivos), através da
manifestação de vontade dos sujeitos,
?
ou causa mortis (após a mort
?
e
?
), que pode se dar
de duas formas: 1) por meio da sucessão testamentária, cujo ato de vontade
manifestado em vida pelo sucedendo irá se concretizar após sua morte por meio
do testamento deixado por ele, ou 2) através
?
da sucessão
?
legítima, seguindo o que estipula a lei.
Fato é que, qualquer transação que envolva bens ou direitos deve ser
minuciosamente planejada, a fim de evitar maiores problemas durante a
concretização do ato, por meio do planejamento patrimonial.
O planejamento patrimonial visa, primordialmente,
a boa gestão e organização do patrimônio de uma pessoa, família ou empresa e,
dentro dele, se destaca o planejamento sucessório, que busca garantir a
transferência dos bens do proprietário, via de regra ainda em vida, por meio de
mecanismos como a doação e criação de holdings, para seus futuros
sucessores - que somente os receberiam após o falecimento do sucedendo -,
evitando assim um processo desgastante de inventário e partilha de bens?.
Ocorre que, a sucessão não se constitui apenas da partilha e recebimento dos
bens constantes em testamento, uma vez que para pleno aproveitamento e
disposição da herança e da doação, é necessário o pagamento de um imposto,
visto que ambos são fatos geradores do Imposto Sobre Transmissão Causa Mortis e
Doação??? (ITCMD), tendo como
contribuintes, no caso da doação, o donatário, e na transmissão causa mortis,
os próprios herdeiros ou legatários, sendo que, nesse caso, a quantidade de
herdeiros e legatários ?será a quantidade de
fatos geradores distintos entre si, conforme parágrafo único do art. 35 do
Código Tributário Nacional. Isso quer dizer que, se houver quatro herdeiros,
haverá quatro fatos geradores do ITCMD e, consequentemente, quatro
contribuintes.
O ITCMD é um imposto de competência estadual cujas alíquotas, atualmente,
variam de 2% a 8% sobre o valor do patrimônio?, a depender da legislação de cada estado.
Contudo, com a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) nº 45/19, que deu início
à tão comentada reforma tributária, o tributo passará a ser cobrado obrigatoriamente
de forma progressiva, alterando o disposto no artigo 155, inciso I, §1° da
Constituição e ??inserindo o inciso
VI no referido parágrafo, cuja redação foi apresentada da seguinte forma:
I - transmissão causa mortis e doação, de quaisquer bens ou direitos;
"Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:
(Redação dada pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993)
§ 1º. O imposto previsto no inciso I:
.
VI - será progressivo em razão do valor do quinhão, do legado ou da doação;?"
Isso quer dizer que, com a eventual
aprovação da Proposta, as alíquotas do ITCMD sofrerão um escalonamento, sendo
que quanto maior o valor dos bens transmitidos, maior a alíquota incidente
sobre os mesmos, gerando uma sobrecarga fiscal em estados com alíquota fixa.
Atualmente, dez estados da federação adotam uma alíquota fixa sobre o ITCMD,
sendo eles: Minas Gerais (5% para morte e doação), Mato Grosso do Sul (6% para
morte e 3% para doação), São Paulo (4% para morte e doação),? Paraná (4% para
morte e doação), Espírito Santo (4% para morte e doação), Alagoas (4% para
morte e 2% para doação), Amazonas (2% para morte e doação), Roraima (4% para
morte e doação), Amapá (4% para morte e 3% para doação) e Acre (4% para morte e
2% para doação), enquanto os demais estados já? adotam a alíquota progressiva para, pelo
menos, um dos fatos geradores do ITCMD - herança ou doaçã?o?. ?
Esse cenário, juntamente com a atual redação constitucional, a qual permite que
o herdeiro realize inventário extrajudicial perante o Tabelionato de Notas do
estado de sua preferência?, torna viável a
possibilidade de criação de "paraísos fiscais sucessórios", uma vez que fica a
critério de cada estado a definição da porcentagem de sua alíquota sobre bens
transmitidos causa mortis, fazendo com que o herdeiro escolha o local
com tributação mais vantajosa para o seu caso concreto.
Diante disso, a PEC 45/19 traz outra importante alteração no texto
constitucional, onde estabelece no artigo 155, §1º, inciso. II, que o estado
responsável pela alíquota do ITCMD será o do domicílio do de cujus,
evitando assim a viabilidade de burlar o sistema tributário nacional.
"Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: (Redação
dada pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993)
I - transmissão causa mortis e doação, de quaisquer bens ou direitos;
§ 1º. O imposto previsto no inciso I:
.
II - relativamente a bens móveis, títulos e créditos, compete ao Estado onde
era domiciliado o de cujus, ou tiver domicílio o doador, ou ao Distrito
Federal;"
Inicialmente, nota-se que a proposta de emenda vem com o nobre intuito de
justiça tributária? e erradicação de
possíveis fraudes ao sistema?,
delineando estratégias para que, sobre bens de valor elevado transmitidos causa
mortis ou doados, incidam tributos mais altos e sobre bens de menor valor
recaia uma porcentagem inferior. Contudo, é necessário pensar não apenas nos
bens de alto valor herdados, mas tamb?ém nas empresas que passam de geração em
geração e nas holdings familiares, constitu?ídas primordialmente
com o intuito de planejamento patrimonial familiar e sucessório, uma vez que as
sociedades podem ter que retirar de seu caixa o capital necessário para arcar
com as altas taxas de ITCMD, afetando substancialmente o patrimônio dos
herdeiros, j?á que a liquidez
financeira das participações societárias não é imediata e, além disso,? as holdings sofrerão
outras alterações tributárias com a aprovação da PEC, como a incidênci?a do lucro real
visto que é?? ?empresa formada com
objetivo de administração de bens próprios.
Nesse diapasão, o planejamento sucessório, além de tornar mais célere o
processo de partilha, inventário e distribuição da herança, ?é medida que se faz
extremamente necessária para aqueles que não desejam ter surpresas futuras pelo
fisco no tocante a transferências sucessórias. Dentre os benefícios do
planejamento estão a economia processual, organização patrimonial, resguardo de
possíveis? conflitos
familiares, manutenção d?e empresas? e a esquiva de
elevados gastos tributários, caso realizado antes da aprovação da proposta,
aproveitando as alíquotas atuais e? d?evendo ser feito pelo detentor dos bens
ainda em vida para que seja válido? post mortem.?
Referências bibliogr?áficas
BRASIL. Código? Tributário
Nacional. Disponível em: ?https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5172compilado.htm
BRASIL. Constituição Federal. Disponível
em: ??https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm
DONIZETTI, Elpídio; QUINTELLA, Felipe;
DONIZETTI, Tatiane. Curso de Direito Civil. Rio de Janeiro: Grupo GEN, 2023. E-book.
ISBN 9786559774654. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9786559774654/.
Acesso em: 14 nov. 2023.
Autor:
Raul
Bergesch é advogado na área do Direito Empresarial, especialista em proteção
patrimonial, sócio-fundador do escritório Raul Bergesch Advogados e membro do
Instituto Brasileiro de Direito Empresarial (Ibrademp) e da Comissão de Direito
Falimentar da OAB-RS, subseção de Novo Hamburgo.