A realidade não obedece a lógica do calendário gregoriano. A não ser que
acreditemos na genial ideia de cortar o tempo em fatias,
industrializando a esperança, registrada por Carlos Drummond. Como se a
vida começasse outra vez, com número novo e a vontade de acreditar que tudo
será diferente. Os ritos, simbolismos, as datas marcantes desempenham papel
essencial na vida humana. Impulsionam fantasias, sonhos e atitudes.
O Brasil sai de 2023 com algumas boas notícias. A
inflação declinou. Os juros caíram. A balança comercial voltou a bater recorde.
O mercado de trabalho está aquecido e o desemprego relativamente baixo. A
economia cresceu bem acima dos 0,8% projetados por especialistas e pelo mercado,
surpreendendo com um incremento no PIB de 3,0%. A rede de proteção social foi
reforçada com a volta da política de valorização do salário mínimo, que
repercute no piso do INSS e no Benefício de Prestação Continuada (BPC), que
assiste aos idosos e às pessoas com deficiência sem cobertura previdenciária. O
Bolsa Família foi reforçado. A temperatura da polarização política cedeu alguns
graus.
O ano de 2023
foi de transição governamental. Os assuntos relativos à política fiscal e ao
orçamento público, "Calcanhar de Aquiles" da economia brasileira, dominaram a
cena. Foi aprovada uma nova regra fiscal que substituiu o chamado teto de
gastos, com foco maior no aumento de receitas. Daí decorreu um pacote de
iniciativas para o aumento da arrecadação com mudanças na tributação sobre
fundos
exclusivos e no exterior, sobre apostas esportivas, sobre as subvenções
econômicas, alterações no funcionamento do CARF - tribunal administrativo na
órbita da Receita Federal, e, a revisão do instituto do Juros sobre Capital
Próprio (JCP). E a melhor notícia, a aprovação final da tão sonhada Reforma
Tributária, que apesar de ter aberto um número excessivo de exceções, alíquotas
e regimes especiais, será um grande avanço na transparência, no fim da
cumulatividade, no fim da guerra fiscal com a tributação no destino e não na
origem, com a diminuição do grau de litigância judicial e com o estabelecimento
de regras nacionais regulando o IVA dual brasileiro. A economia ganhará em
produtividade e eficiência a médio prazo.
Como a realidade
brasileira assemelha-se a um copo meio cheio, meio vazio, alguns indicadores
sociais continuam desafiadores. O pior de todos e mais decisivo é o desempenho
das crianças e dos jovens no aprendizado escolar. O Brasil, na última avaliação
internacional, continuou a frequentar o clube dos piores desempenhos. Para o
ano de 2024, é prevista uma redução no ritmo da economia, sendo projetado um
aumento de cerca de 1,2% no nosso PIB. A inflação deve continuar a ceder,
permitindo que o Banco Central continue a baixar os juros. As exportações de
commodities continuarão a alavancar nosso desenvolvimento. O grande desafio
será mais ousadia, criatividade e eficiência nas políticas sociais de educação,
saúde e desenvolvimento social. E que o novo marco regulatório do saneamento
comece a resgatar a dívida histórica que temos com a população.
Teremos eleições
municipais, importante momento de reflexão e decisão sobre as cidades, as
políticas públicas e sua repercussão no dia a dia da população.
Que venha 2024! Vamos fazer valer a pena!
aUTOR:MARCUS PESTANA, Diretor-executivo
da Instituição Fiscal Independente (IFI). Economista, foi deputado federal e estadual
e presidente do PSDB de Minas Gerais. Também foi secretário estadual da Saúde e
professor da Universidade Federal de Juiz de Fora.