A
presente reflexão visa clarear um certo raciocínio lógico a respeito da
importância do preço de saída quando da elaboração do balanço de determinação,
que é um relatório totalmente distinto do balanço ordinário[1] constante da Lei 6.404/1976.
O preço de saída não
se confunde com o preço de entrada, pois o preço de entrada representa o valor
pago quando da aquisição e o preço de venda representa o quanto vai entrar no
caixa, quando da venda do bem. Como exemplo, temos o preço de entrada de uma
mercadoria que se registra no estoque, sendo o preço de saída desta mesma
mercadoria aquele constante da nota fiscal de venda.
O preço de saída é
um critério de valorimetria de ativos e passivos para o balanço de
determinação, quando da apuração de haveres de sócios ou acionista que se
retira da sociedade. O preço de saída é o valor corrente ou venal de mercado de
um bem ou serviço, logo, é o valor médio que normalmente se obtém na alienação.
Em síntese, o preço de mercado ou preço de saída é o montante em dinheiro, pelo
qual um produto, serviço ou mercadoria é frequentemente negociado em um
determinado lugar e decorrente da livre-iniciativa e concorrência pautada na lei
da oferta e procura, e representa o contrapolo do preço de entrada.
A atividade
interpretativa de um perito se dá através de um raciocínio formado pela
combinação de premissas, como (texto legislativo CPC/2015, art. 606 e dos fatos
do caso concreto, situação de haveres ou deveres), onde a colocação fática
contábil à norma, CPC/2015, art. 606 conduz à solução do caso concreto. Neste
conjunto interpretativo, o laudo pericial é o resultado de uma atividade de um
raciocínio lógico-contábil desenvolvida pelo perito, como um processo
cognitivo, no qual o intérprete perito aplica a norma jurídica. E com este viés
a atividade do perito é classificada como formalismo cognitivismo. Portanto, o
preço de saída é um critério de avaliação de ativos e passivos, art. 606 do
CPC/2015, para fins de apuração de haveres e/ou deveres de sócio/acionista.
Temos novo corpo para o balanço, agora com
uma nova alma, a de determinação do preço de um ativo ou passivo, que é algo
totalmente distinto de valor[2],
que é subjetivo à luz da Teoria Contábil do Valor. Já que inegavelmente o
CPC/2015 traz uma nova formulação para a valorimetria patrimonial ao assumir
uma função mais superlativa no processo de apuração de haveres ou deveres,
claro que isto impõe aos peritos o dever da prudência e de equidade quando da
atribuição de preços, evitando-se abusos e atendendo aos anseios de preço
justo. Pois o preço de saída é uma métrica de valorimetria deveras importante
para a obtenção de um justo preço das quotas/ações, porquanto, não se aplica ao
balanço de determinação, preço de entrada regularizado pelo RIR/2018 e nem as
regras de avaliação constantes da Lei 6.404/1976, pois o balanço de
determinação possui regras próprias e específicas, que são as constantes do
art. 606 do CPC/2015, não existindo nenhuma forma de antinomia em relação ao
RIR/2018 ou à legislação societária. A validade do RIR/2018 é apenas para fins
de calcular a carga tributária e omissões de receitas, e não para definir
critério de avaliação de ativos ou passivos nos balanços especial de apuração
de haveres ou deveres.
O preço de saída
corresponde ao do mercado de venda, é a expressão monetária média que
normalmente se obtém na alienação de um bem ou de um direito, ou seja, é o
valor relativo à capacidade de converter-se em moeda corrente.
À luz da ciência contábil, logo, das
Teorias da Eficiência da Prova Pericial Contábil, e a do Valor, além da
aplicabilidade da doutrina, a apuração de haveres e/ou deveres de sócios deve
observar o critério patrimonial[3], e quanto possível, o patrimônio societário real
como um todo, e não apenas sua dimensão formal contábil ou fiscal putativa,
portanto, o preço de saída implica em um levantamento contábil de preço amplo e
atualizado, englobando um balanço de determinação do ativo e passivo,
levando-se em conta para a formação do patrimônio líquido, ativos tangíveis e
intangíveis, fundo de reserva patrimonial, lucros/prejuízos acumulados, e
principalmente o fundo de comércio internamente desenvolvido.
O balanço de
determinação é um balanço especialmente levantado para apuração de haveres ou
deveres, o qual reflete os preços dos ativos e passivos, a preços de saída,
inclusive, os ativos intangíveis, como o fundo de comércio, todos passivos
contingentes, e inclusive o patrimônio líquido e o patrimônio ilíquido. O preço
de saída do balanço de determinação é elaborado a partir de uma devida
compreensão técnica de sua aplicação, e é de extrema importância para uma justa
apuração, seja ela, dos haveres ou deveres do sócio que deixa a sociedade, a
fim de evitar a abominável figura da locupletação sem causa.
As fundamentações técnico-cientificas
vinculadas aos critérios individuais de precificação dos saldos das contas ativas
e passivas a preço de saída, podem ser consultadas na literatura especializada:
HOOG, Wilson Alberto Zappa. Resolução de Sociedade &
Avaliação do Patrimônio na Apuração de Haveres - De acordo com o Código Civil
Lei 10.406/2002. 8. ed. Curitiba: Juruá, 2022.
E por derradeiro, é conditio
sine qua non, que na modalidade de avaliação do patrimônio
líquido a preço de saída, seja incluído todos os ativos e passivos contingentes
não contabilizados, ajustando o balanço patrimonial, para adequá-lo ao
princípio da veracidade, da competência e ao da epiqueia contabilística,
portanto, sendo incluído o preço do fundo de comércio autodesenvolvido, assim
como, todos os ativos e passivos ocultos, e excluídos os ativos e passivos
fictícios. Inclusive os efeitos, se houve, de uma contabilidade paralela com o
seu ilícito caixa dois oriundo de omissões de receitas.
Em síntese esta
reflexão contábil representa uma narrativa da importância do preço de saída
contido no art. 606 do CPC e na doutrina. A pronúncia judicial, como regra
geral, busca a manutenção de uma segurança jurídica, em relação a doutrina, já
que estamos escrevendo sobre a literatura como uma possível fonte de direito
que visa apenas o reconhecimento da natureza jurídica probante de um
fato patrimonial.
[1] BALANÇO ORDINÁRIO - é o balanço patrimonial
normalmente levantado no término do exercício social, para atender à legislação
societária, portanto, reflete somente o valor patrimonial contábil espelhando a
situação patrimonial da sociedade por critérios da legislação societária.
[2] VALOR - o valor de um bem ou serviço decorre da sua
utilidade pessoal e capacidade de converter-se em moeda corrente. Utilidade é a
capacidade de um bem ou serviço de satisfazer necessidades, seja dos sócios ou
da sociedade, logo, o valor é o que se atribui a um bem ou serviço pela sua
utilidade subjetiva pessoal.
[3] CRITÉRIO PATRIMONIAL - tudo o que está vinculado ao
objeto da ciência da contabilidade, o patrimônio, ou seja, a riqueza, material
ou imaterial vinculada às células sociais (ativo, passivo e rédito). Logo,
diferencia-se de critérios financeiros como o fluxo de caixa descontado. Um
critério patrimonial busca o valor patrimonial real com certeza científica.
[4] FUNDO DE RESERVA PATRIMONIAL - é uma
espécie de retenção de lucros/capital feita para fins de capitalização e
fortalecimento dos negócios, como, por exemplo: as reservas de capital, as
reservas de incentivos fiscais, e as reservas de lucros nas modalidades de:
reserva legal, de expansão dos negócios como novos investimentos na
operação e reservas para contigenciais, e/ou simplesmente para se evitar a
distribuição de dividendos com base em realização econômico sem que exista a
realização financeira. O fundo de reserva patrimonial é um recurso da sociedade
para possíveis gastos extraordinários que conferem uma segurança
financeira-econômica aos negócios.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei 13.105, de 16 de março de 2015.
Código de Processo Civil.
______. Lei 6.404, de 15 de dezembro de 1976.
Dispõe sobre as Sociedades por Ações.
______. Decreto 9.580, de 22 de novembro de
2018. Regulamenta a tributação, a fiscalização, a arrecadação e a administração
do Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza.
HOOG, Wilson Alberto Zappa. Resolução de Sociedade & Avaliação do Patrimônio na Apuração de
Haveres - De acordo com o Código Civil Lei 10.406/2002. 8.
ed. Curitiba: Juruá, 2022.
Autor: Wilson A. Zappa Hoog é sócio do Laboratório de perícia
forense-arbitral Zappa Hoog & Petrenco, perito em contabilidade e mestre em
direito, pesquisador, doutrinador, epistemólogo, com 48 livros publicados,
sendo que alguns dos livros já atingiram a marca de 11 e de 16 edições.