Juros, emprego e
renda até podem jogar a favor do consumo. Agora, crédito continua caro,
consumidor, ainda mais exigente, e competição com importados só deve aumentar
Janeiro é o mês em
que os empresários fazem as projeções para os negócios no ano, considerando as
condições econômicas e os desafios impostos para o setor.
Neste início de ano,
tem especialista em varejo achando que 2024 está parecido com o começo de 2020,
quando o país vivia uma fase de otimismo, atropelada pela pandemia.
"2024 pode ser o
melhor ano dos últimos cinco anos, se não acontecer uma catástrofe", diz Marcos
Hirai, sócio-fundador do NDEV (Núcleo de Desenvolvimento de Expansões Varejistas).
Os desafios, diz,
são praticamente os de sempre: crédito restrito e caro, falta de mão de obra e
um consumidor que quer cada vez mais preço, qualidade, experiência e
omnicanalidade.
O crédito, diz,
continua sendo um dos maiores problemas enfrentados pelos empresários.
A taxa básica de
juros da economia, a Selic, que estava em 4,25% ao ano no início de 2020, hoje
é de 11,75% ao ano, com projeção de chegar a 9% somente no final deste ano.
Agora, tem outros
indicadores que jogam na direção de um cenário mais otimista. Renda, emprego,
inflação e confiança dos empresários estão e devem se manter positivos em 2024.
Executivo de uma das
maiores empresas de shoppings do país confirma que este ano já começou
diferente de 2023 nas conversas que tem mantido com os donos de lojas.
Há mais confiança na
economia e nos negócios, diz ele, a ponto de os empresários voltarem a falar em
investimentos, expansão, tanto que a vacância nos empreendimentos já
diminuiu.
Os indicadores
macroeconômicos não são para soltar rojões, mas indicam uma melhora em relação
a 2023, para especialistas em varejo, lojistas, executivos de shoppings e
economistas.
"Os riscos em
relação às questões conjunturais vistos em 2023 por causa da Americanas também
são menores em 2024", diz André Galhardo, consultor econômico da Remessa
Online.
A postura mais
defensiva dos bancos enfrentada no ano passado, diz, começa a diminuir, o que
pode favorecer o varejo de bens de maior valor, como o de eletroeletrônico e
móveis.
"Os investimentos
caíram tão profundamente no último ano que, estatisticamente, podemos ter
números mais positivos neste ano", afirma.
Se de um lado o
cenário econômico está mais desanuviado, diz Luiz Alberto Marinho,
sócio-diretor da Gouvêa Malls, de outro existe a complexidade da operação do
varejo.
O empresário que
insistir em tocar um negócio como fazia no passado, de acordo com ele, não deve
sobreviver.
A competição não é
mais com o lojista da porta ao lado, mas com comerciantes do mundo todo, o que
obriga as empresas a atenderem os clientes nos modelos físico e digital.
"O mundo passou a
ser figital", afirma.
Se o mercado fica
mais favorável ao consumo, diz Marinho, também surgem pressões de alta de
custos, como aluguel, salários e insumos.
Para ele, as
relações entre shoppings e lojistas terão de evoluir. O avanço do varejo para a
omnicanalidade deve forçar uma revisão do modelo de negócio de shoppings.
"Os contratos podem
não mais estar atrelados ao faturamento. Os shoppings poderão ter de calibrar
os valores cobrados das lojas, considerando a função e não somente as vendas",
diz.
Veja abaixo o que os
especialistas em varejo esperam para 2024:
MARCOS HIRAI
O clima de otimismo
voltou. Se não tiver nenhuma catástrofe, tudo indica que 2024 será um bom ano para
a economia e para o consumidor.
Crédito e mão de
obra ainda são problemas a serem enfrentados pelos varejistas. O crédito
continua caro e o lojista não consegue encontrar e manter profissionais. O
turnover é alto.
E quando o
consumidor começa a comprar mais, começam as pressões para aumentos de aluguel,
capital de giro, salários. Essas são ameaças que rondam os lojistas neste
início de ano.
Se a vacância nos
shoppings diminui, há pressão para alta de custos de ocupação, o que já se viu
no país.
A tendência é que
com uma vacância menor, os shoppings endureçam nas negociações.
Alguns setores terão
desafios maiores com o avanço do e-commerce, como o eletroeletrônico e o de
vestuário, que deverão passar por uma prova de fogo.
O desafio é criar
atrativos para o consumidor que prefere mais preço do que experiência. O
lojista médio está sob maior pressão.
Mas não vejo nenhum
desafio tão grande como vimos nos últimos quatro anos.
LUIZ ALBERTO MARINHO
Quatro indicadores
são fundamentais para a economia: renda, emprego, inflação e confiança, e todos
esses são mais positivos.
Há um cenário de
competição crescente. Não dá mais para achar que o maior concorrente é o
lojista do lado ou da frente. A concorrência é com o e-commerce, com lojistas
chineses.
Se de um lado o
cenário econômico está mais desanuviado, de outro há a complexidade da operação
do varejo, que faz com que lojistas menos preparados não consigam competir.
É preciso ampliar a
base de clientes e trabalhar com estoques direcionados para o público onde está
localizada a loja.
O comerciante menor,
quando trabalha de forma ineficiente, a punição vem mais rápido do que para o
grande.
Existe hoje uma
polarização entre o varejo de valor e o de experiência. O de valor é aquele que
vende produtos com qualidade e preço acessível.
No outro extremo,
marcas de luxo precisam fazer ofertas direcionadas, mimar os clientes. Quem não
vende barato ou não é charmoso vai ter mais dificuldade.
O e-commerce veio
para ficar e vai crescer e o lojista que não utilizar os canais on e off vai
operar com desvantagem, não tem jeito.
Os programas de
fidelidade devem marcar 2024, pois permitem que o varejista coloque o
consumidor no centro do negócio, com comunicação e estoque direcionados para
ele.
A relação entre
lojista e shopping também vai ter de evoluir em algum momento.
O avanço do varejo
para a omnicanalidade deve forçar uma revisão do modelo de negócio de shopping,
que calcula o aluguel em relação à capacidade de vendas em um espaço físico.
Nos EUA, já tem
shopping cobrando a chamada flat rate, uma taxa que varia de acordo com a
função da loja. Não há uma relação de aluguel atrelada à venda e sim uma taxa
de ocupação.
Deve chegar um
momento em que os shoppings não vão precisar de loja somente para vender e
terão, progressivamente, de se aproximar dos lojistas para defendê-los.
ANDRÉ GALHARDO
FERNANDES
O escândalo da
Americanas segurou o crédito em 2023, o que não deve acontecer neste ano.
E, com a queda de
juros, há espaço para a venda de bens de consumo duráveis, como eletrodomésticos
e móveis.
A venda de produtos
básicos deve continuar crescendo no mesmo ritmo dos últimos anos.
A massa salarial
cresce menos que em 2023, mas cresce e a inflação deve ficar mais próxima da
meta, perto de 3,9% neste ano.
Fonte: Diário do
Comércio