A Oitava Turma do
Tribunal Superior do Trabalho acolheu o recurso de um fazendeiro de Corinto
(MG) e determinou a desocupação de um imóvel cedido a um vaqueiro em comodato.
A decisão levou em conta que havia previsão expressa no contrato de trabalho de
que o imóvel seria devolvido ao fim do contrato ou em caso de afastamento
previdenciário.
Acidente
Na ação trabalhista,
o trabalhador rural disse ter sido contratado em outubro de 2018 para atuar em
uma fazenda. Em maio de 2019, sofreu um acidente ao vacinar os bovinos e ficou
afastado pelo INSS.
Venda
Em setembro de 2021,
o proprietário vendeu a fazenda e notificou o vaqueiro de que seu contrato
seria rescindido. Com isso, ele deveria desocupar o imóvel em que morava.
Direito à moradia
Na reclamação trabalhista,
além de pedir indenização por danos morais, estéticos
e materiais em razão do acidente, o trabalhador alegou, entre outros pontos,
que o contrato de trabalho estava suspenso em razão do auxílio-doença e que a medida violaria o direito
constitucional à moradia.
Perda da ruralidade
O fazendeiro contrapôs um pedido para que a Justiça
determinasse a desocupação. Em sua defesa, argumentou que sua situação era a
de empregador doméstico e que a venda da fazenda
implicaria a "perda da ruralidade". Segundo seu raciocínio, não é possível a
continuidade da prestação de serviços rurais para um empregador pessoa física
que não tenha mais terras.
Empréstimo gratuito
Outro argumento foi o de que havia assinado com o
vaqueiro um contrato de comodato (empréstimo gratuito), acessório
ao contrato de trabalho, para facilitar a prestação de
serviço. Esse contrato, segundo o fazendeiro, previa que o imóvel deveria ser
devolvido em caso de afastamento previdenciário. Embora tivesse autorizado o
vaqueiro a continuar ali enquanto estava afastado, isso não lhe garantiria o
direito de "viver para sempre no local, mesmo após a venda da fazenda".
Desocupação
O juízo da Vara do
Trabalho de Curvelo deferiu om pedido do fazendeiro, por entender que,
independentemente de o contrato estar suspenso ou ser extinto pela venda da
fazenda, os termos do contrato de comodato era claros quanto às hipóteses de
desocupação.
Suspensão do
contrato
Contudo, o Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região
(MG) reformou a sentença. Para o Tribunal Regional do Trabalho, o afastamento
do empregado por motivo de doença suspende o contrato de trabalho em
relação às obrigações principais (prestação de serviços e pagamento de
salários), mas as demais disposições contratuais ficam mantidas, entre elas o
direito à moradia. "Essas obrigações secundárias aderem ao contrato de trabalho, tendo em vista, ainda, que a
impossibilidade de prestação de serviços decorre de fato alheio à vontade do
empregado", registrou a decisão.
Direito de
propriedade
O relator do recurso
de revista do fazendeiro, desembargador convocado Eduardo Pugliese, observou
que a Constituição Federal prevê, entre os direitos fundamentais, a moradia e a
propriedade. "O papel do julgador é o de dar a maior efetividade a esses
direitos e, para tanto, deve fazer a integração das normas com os princípios
gerais do direito", explicou.
No caso, o relator ressaltou que, conforme delineado
pelo Tribunal Regional do Trabalho, trata-se de uma situação em que as próprias
partes convencionaram o termo final do contrato e as possíveis exceções para
seu término, entre elas a suspensão decorrente de benefício
previdenciário.
Ele destacou, ainda, que não há nenhum registro de vício
de consentimento em relação às cláusulas previstas. A decisão do Tribunal
Regional do Trabalho, a seu ver, violou o direito de propriedade e o princípio
de que os acordos devem ser cumpridos.
Ficou vencida a ministra Delaíde Miranda
Arantes.
Nota M&M: Destacamos que esta
decisão foi aplicada neste processo específico, e pode servir como um norteador
para futuras sentenças. Porém, situações semelhantes poderão ter decisões
diferentes, especialmente nas esferas de primeiro e segundo graus.
Fonte:
Tribunal Superior do Trabalho - Processo: RR-10009-72.2022.5.03.0056,
com "nota" da M&M Assessoria Contábil.
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