O Supremo Tribunal
Federal [1] decidiu por unanimidade que não
incide imposto de renda sobre doações em adiantamento de legítima, nas
operações de transferência de bens ou direitos aos herdeiros de forma não
onerosa.
Através do leading
case Recurso Extraordinário (RE) 1439539, a Fazenda Nacional pugnou pela
incidência de tributação sobre a renda em relação ao acréscimo patrimonial do
doador, ocorrido entre a aquisição dos bens e o valor atribuído a eles no
momento da transferência por doação.
Todavia, a corte
entendeu que [2]"não há fato gerador do IRPF no
adiantamento da legítima por falta de materialidade tributária ao suposto
acréscimo patrimonial em favor do doador", sendo este o entendimento mais
técnico considerando a hipótese de incidência em tela.
Isto porque, o
Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), de competência dos
estados, incide sobre a transferência não onerosa de patrimônio por ocasião de
abertura de sucessão, ou ainda, em decorrência de doação de bens em favor de
terceiros.
Já o Imposto de
Renda sobre Ganho de Capital terá sua tributação na cessão de bens com
valorização entre o preço de aquisição e o da transferência em favor de
terceiros, a qual caracterize aumento patrimonial pelo cessionário na operação.
Apuração de ganho de
capital
No âmbito federal, a
Lei 9.532/1997 determina que, haverá apuração de ganho de capital para fins de
tributação sobre a renda quando da transferência de direito de propriedade por
sucessão, nos casos de herança, legado ou por doação em adiantamento da
legítima ocorrer aumento patrimonial entre o custo de aquisição e o valor de
mercado declarado na operação.
Ou seja, uma vez
caracterizado aumento patrimonial em decorrência da operação de transferência
de patrimônio via doação ou sucessão causa mortis, deverá ser recolhido o
imposto renda por ocasião do ganho de capital.
Contudo, a hipótese
de incidência originária nada mais é do que a tributação sobre renda, em que o
ganho de capital é uma das hipóteses de aumento de capital, sendo certo que o
escopo principal da regra matriz é o mesmo.
O [3]Regulamento do Imposto de Renda determina que haverá
incidência do tributo sobre o sujeito que auferir renda ou proventos de
qualquer natureza, inclusive rendimentos e ganhos de capital. Ou seja, a
hipótese de incidência necessita de uma ação do contribuinte que aumente o seu
patrimônio.
Fato gerador do ICMD
Já no caso do fato
gerador do ITCMD, a transferência de patrimônio por ocasião de sucessão causa
mortis ou por doação, não há ação onerosa entre as partes, o que por si só
já descaracteriza a natureza de renda ou provento.
Não há como
sustentar a cobrança de IR - Ganho de Capital na transferência de bens nas
hipóteses de incidência do ITCMD, ainda que ocorra valorização entre o preço de
aquisição e o de mercado declarado pelo contribuinte, conforme bem pontuado
pela Suprema Corte no julgamento do caso concreto.
A jurisprudência
formada no âmbito do STF traz maior segurança jurídica as estruturas
societárias organizadas com objetivo de otimizar a partilha de bens em face dos
herdeiros, como o caso das holdings familiares.
No [4]modelo de holding familiar constituída para fins
sucessórios, os patriarcas proprietários do patrimônio transferem os bens à
pessoa jurídica e cedem as quotas de forma não onerosa aos herdeiros, mediante
a reserva de cláusulas de usufruto, impenhorabilidade e inalienabilidade.
Proteção de
patrimônio
As cláusulas de impenhorabilidade
e inalienabilidade têm por objetivo proteger o patrimônio de eventuais dívidas
contraídas pelos herdeiros sócios na qualidade de nu-proprietário das quotas,
em que ficarão impossibilitados de oferecê-las em garantia por ocasião do
usufruto dos patriarcas da família.
Ademais, no caso de
abertura de sucessão, o planejamento realizado evitará litígios entre os
sócios, pois cada um deles receberá as quotas já determinadas no contrato
social da empresa.
Nesta operação,
haverá incidência única de ITCMD em favor dos estados, uma vez que não há
onerosidade ou ação das partes que caracterize a natureza de rendimento, para
fins de incidência de tributação sobre a renda.
Com base nestes
reflexos, a jurisprudência se torna um precedente muito importante em favor do
contribuinte, pois analisa de forma técnica não só a questão da competência de
tributária entre os entes, como também a regra matriz de ambos os tributos, as
quais as hipóteses de incidência previstas na legislação são totalmente
divergentes.
[1] https://noticias.stf.jus.br/postsnoticias/stf-rejeita-cobranca-de-imposto-de-renda-de-doador-sobre-adiantamento-de-heranca/
[2] Recurso
Extraordinário (RE) 1439539 - Rel. Min. Flávio Dino
[3] Art. 1º As
pessoas físicas que perceberem renda ou proventos de qualquer natureza,
inclusive rendimentos e ganhos de capital, são contribuintes do imposto sobre a
renda, sem distinção de nacionalidade, sexo, idade, estado civil ou profissão -
DECRETO Nº 9.580, DE 22 DE NOVEMBRO DE 2018
[4] https://www.linkedin.com/pulse/holding-familiar-e-prote%25C3%25A7%25C3%25A3o-do-patrim%25C3%25B4nio-thiago-santana-lira/?trackingId=6SiEmNAvT9i2oEqiFtWYkA%3D%3D
Autor: Thiago Santana Lira. Advogado sócio em Barroso Advogados
Associados e MBA em Gestão Tributária, Contencioso e Consultivo Tributário