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RH: Garantia de Direitos Individuais em Detrimento aos Coletivos


Publicada em 07/01/2025 às 09:00h 

Uma decisão do Tribunal Superior do Trabalho (TST) - veja a notícia ao final - que condenou uma empresa a indenizar uma empregada transgênero por discriminação e assédio, pode levantar uma grande tensão entre os direitos individuais em detrimento de direitos coletivos.

Transgêneros são pessoas que não se identificam com o gênero a qual foram designadas, baseado em seu sexo biológico.

Contudo, há também a necessidade de equilibrar direitos individuais e coletivos no âmbito laboral, de forma a garantir a dignidade das pessoas transgêneros, bem como o direito à privacidade das empregadas cisgêneras (pessoas que se identificam com o gênero que lhes foi atribuído no nascimento).

Assim como ocorre em relação a obrigação por parte da empresa em implementar políticas que visam a isonomia nos mais diversos aspectos laborais entre o sexo masculino e feminino, também devem ocorrer em relação à inclusão da diversidade de gêneros, adotando não apenas medidas formais, mas que envolvam a prática cotidiana.

Garantir a utilização do nome social de uma pessoa transgênero, conforme previsto no Decreto Federal nº 8.727/2016, que regulamenta o uso do nome social no serviço público federal, pode ser uma das formas de implementar esta isonomia no setor privado.

Disponibilizar instalações sanitárias e de troca de uniforme alternativas, para acomodar tanto as pessoas transgêneros quanto as empregadas cisgêneras, respeitando a liberdade em compartilhar o ambiente e privacidade de todas, também pode ser uma outra forma de isonomia.

É importante que a empresa comprovar este tipo de procedimento ou de ação, educando seus empregados sobre as diferenças entre identidade de gênero e orientação sexual. Além de palestras e campanhas, é recomendável que haja um plano mais abrangente que inclua políticas claras de repreensão para todo e qualquer tipo de discriminação, aplicação de medidas disciplinares, treinamentos presenciais ou virtuais que envolva estes temas.

A empresa também pode revisar e adequar seus regulamentos internos, de modo a se adequar à legislação trabalhista e aos princípios constitucionais. O próprio art. 2º da CLT permite à empresa, através do seu poder diretivo, estabelecer regras às quais os seus empregados estão sujeitos.

A privacidade e a segurança das empregadas cisgêneras, que podem se sentir vulneráveis em espaços compartilhados com pessoas transgêneras, que não realizaram transição completa ou definitiva, podem ser garantidas através de um regulamento interno, o qual deve ser apresentado a todos os empregados que iniciar suas atividades na empresa.

Os conflitos entre o sexo masculino e feminino dentro de uma empresa sempre existiram e continuarão existindo. Isto não será diferente em relação as pessoas transgêneros, pois faz parte da convivência humana, já que os conflitos se apresentam até mesmo entre pessoas do mesmo sexo.

O RH da empresa deve ser treinado e capacitado para atuar como mediador em eventuais conflitos entre empregadas transgêneros e cisgêneras. Uma solução é abrir canais de comunicação para compreender os receios de cada parte e buscar um consenso, sem que nenhuma das partes seja prejudicada. Isso é crucial para evitar a percepção de favorecimento de uma minoria em detrimento da maioria.

Embora a Constituição Federal assegure o direito à dignidade da pessoa humana (art. 1º, III e art. 5º), é necessário que a coletividade também seja respeitada. A imposição de direitos individuais que conflitam diretamente com os direitos de um grupo majoritário por parte do judiciário, pode gerar ressentimentos e litígios futuros. Assim, uma decisão que privilegie uma minoria sem considerar o contexto coletivo, pode infringir o próprio princípio de igualdade presente no art. 5º, caput, da Constituição Federal.

No caso da decisão mencionada, o TST enfatizou a necessidade de criação de um ambiente inclusivo. Contudo, a justiça trabalhista não pode exigir que as empresas desconsiderem situações reais e sensíveis das empregadas cisgêneras, como a privacidade em vestiários e banheiros, onde a exposição corporal é inevitável.

A empresa deve buscar soluções equilibradas que não apenas previnam indenizações, como também promovam um ambiente de trabalho harmônico. Entretanto, é preciso cautela ao lidar com decisões judiciais que podem interferir no poder diretivo da empresa e nos direitos da coletividade feminina, exigindo medidas que nem sempre consideram a realidade do local de trabalho.

Veja a íntegra da notícia sobre o julgamento do TST no caso de indenização:

Mulher trans desrespeitada em frigorífico será indenizada - ela era proibida de usar o vestiário feminino e foi alvo de piadas e humilhação no vestiário masculino

Resumo:

Uma empregada transgênero será indenizada por sofrer discriminação e assédio no trabalho, incluindo piadas, humilhações e proibição de usar o vestiário feminino. A empresa alegou ter políticas de inclusão, mas a Justiça do Trabalho considerou que a distribuição de cartilhas e palestras não são suficientes para afastar a discriminação. A 6ª Turma do TST manteve a condenação, destacando que a identidade de gênero é um direito fundamental e que a empresa falhou em criar um ambiente de trabalho inclusivo. 

A Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou examinar o recurso de um frigorífico de Araguari (MG), contra a condenação ao pagamento de indenização a uma faqueira desrespeitada no trabalho por ser mulher trans. Conforme a decisão, a empresa falhou em criar um ambiente de trabalho inclusivo e respeitoso quanto à identidade de gênero de seus empregados.

Trabalhadora sofria humilhações no vestiário masculino

A faqueira foi contratada em 2014 e dispensada em 2019. Na ação, ela afirmou que, nos cinco anos de contrato, a empresa se negou a tratá-la por seu nome social e a proibia de usar o banheiro e vestiário feminino. Também disse que sofria violência psicológica diária dos colegas e tratamento discriminatório do encarregado, que lhe delegava trabalhos que não eram de sua função e exigiam força física, sob a alegação de que ela "era homem". 

De acordo com a trabalhadora, o argumento do frigorífico para proibi-la de usar o vestiário feminino era que as empregadas "não gostavam da presença de 'travestis' no banheiro de mulher e que a empresa não tinha o que fazer nesse caso". Como nem sempre era possível se trocar dentro de um box, em razão do movimento intenso, o momento da troca do uniforme "se tornava humilhante", pois "sempre era alvo de piadas" e de ofensas a seu corpo, sua sexualidade e seu gênero. 

Frigorífico disse que distribuía cartilhas e fazia palestras

Em sua defesa, o frigorífico alegou que tinha "nove homossexuais" no setor de abate, o que comprovaria que não havia discriminação. Também argumentou que os empregados não podiam ser obrigados a chamar a trabalhadora pelo nome social e que adotava ações para reprimir e prevenir agressões à identidade de gênero e à sexualidade dos empregados, promovendo palestras e distribuindo cartilhas com seu código de ética.

Medidas não foram suficientes

A 2ª Vara do Trabalho de Araguari (MG) e o Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (MG) condenaram o frigorífico a pagar indenização de R$ 35 mil. Para o TRT, as ações relatadas pela empresa não caracterizam efetiva implementação de políticas de inclusão. Para isso, seriam necessárias condutas concretas, como o respeito ao nome social, a aplicação de penalidades a quem praticar discriminação e até a alteração de instalações sanitárias a fim de evitar constrangimentos.

Empresa confundiu conceitos

A ministra Kátia Arruda, relatora do recurso da empresa, destacou que a identidade de gênero diz respeito à autopercepção de cada pessoa. "A trabalhadora teve questionada sua própria identidade pessoal, em decorrência da falha da empresa em criar um ambiente de trabalho inclusivo e respeitoso quanto à identidade de gênero de seus empregados", afirmou, lembrando que ela era tratada a partir de estereótipos masculinos, como o de que seria mais adequada para tarefas que exigissem a força física. 

Para a ministra, o próprio argumento da empresa de que não haveria preconceito e discriminação porque haveria "homossexuais no setor de abate" revela o equívoco conceitual entre identidade de gênero e orientação sexual, demonstrando a falta de compreensão sobre a matéria. "A distribuição de cartilhas e a promoção de palestras não foram suficientes para esclarecer a própria empregadora sobre os contornos, a profundidade e a relevância da inclusão da diversidade no contexto do respeito aos direitos humanos", assinalou. 

Essa impressão é acentuada com a alegação da empresa de que não haveria a obrigação de chamar os empregados por seus nomes sociais, que, "na realidade compõem uma das dimensões da personalidade". Essa postura caracteriza, segundo a ministra, a falta de respeito à identidade de gênero da empregada, "fragilizando ainda mais a tese de que haveria real grau de esforço educativo no âmbito da empresa".

A decisão foi unânime.

Autor: Sérgio Ferreira Pantaleão








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