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Cálculo do ICMS próprio e do ICMS-ST


Publicada em 22/12/2023 às 09:00h 


Há anos a controvérsia acerca do cálculo do ICMS próprio e do ICMS por substituição tributária é objeto de discussão pelas distribuidoras de combustíveis. Isso porque, como atuantes atacadistas deste setor, as legislações tributárias estaduais determinam, como regra geral, a responsabilidade das distribuidoras no recolhimento do ICMS próprio (ou normal) referente à operação que está sendo realizada, e o ICMS por substituição tributária referente às operações subsequentes (ICMS-ST).

Assim, em decorrência de uma única operação que pratica, as distribuidoras acabam recolhendo o imposto estadual nas duas modalidades: ICMS próprio e ICMS-ST.

É neste contexto que o presente artigo visa demonstrar as divergências encontradas entre a Fazenda e as distribuidoras em relação ao cálculo da substituição tributária, dando , portanto, origem à exigência de complementação do ICMS-ST.

Como já mencionado acima, por força das legislações tributárias estaduais e a depender do tipo de combustível - no presente estudo trataremos do álcool etílico hidratado carburante (AEHC) -, as distribuidoras são responsáveis pelo recolhimento do ICMS normal e do ICMS-ST.

Em outras palavras, ao realizar operação de venda para cliente estabelecido no Estado de Sergipe, por exemplo, torna-se devido o recolhimento do ICMS próprio referente à operação que está sendo realizada e também o ICMS-ST referente às operações subsequentes, que, se presumem, serão realizadas pelos respectivos adquirentes.

Logo, realizando uma única operação, as distribuidoras recolhem o imposto estadual sob as duas modalidades: próprio e por ST.

Feitas estas considerações preliminares, passa-se a dispor sobre a divergência dos cálculos relativos ao ICMS/ST.

O ICMS-ST é calculado aplicando-se a alíquota vigente na época da operação sobre a respectiva base de cálculo, obtida pela multiplicação do volume comercializado de combustível pelo denominado "Preço Médio Ponderado ao Consumidor de Combustíveis Final" (PMPF), que corresponde a um preço estimado para o produto na sua última operação.

Do produto desta multiplicação, é deduzido o ICMS próprio, para então, se obter o valor do ICMS-ST.

Logo, o ICMS-ST nada mais é do que o valor do imposto que a distribuidora, na qualidade de substituta tributária, adiciona ao valor da respectiva nota fiscal de venda para efeito de efetuar a retenção do imposto previsto e, posteriormente, recolhê-lo. De tal modo, a fórmula matemática do ICMS-ST é a seguinte: ICMS-ST = [PMPF x volume (em litros) x alíquota] - ICMS próprio

Por sua vez, o ICMS próprio corresponde à aplicação da mesma alíquota sobre a sua base de cálculo, que é o próprio valor da operação, correspondente ao preço unitário (por litro) do produto multiplicado pelo respectivo volume. Ficando a fórmula da seguinte forma: ICMS próprio = preço unitário x volume (em litros) x alíquota

Já o PMPF é fixado por cada unidade federativa interessada no âmbito da sua competência tributária e divulgado pelo Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), composto por representantes fazendários de todas as unidades federativas.

Assim, com regular frequência, são publicados os chamados atos Cotepe/PMPF e divulgados os PMPF vigentes para determinados períodos.

Ocorre que, neste contexto, as distribuidoras de combustíveis são comumente autuadas pela ausência de recolhimento do imposto estadual, relativo ao que seria devido a título de ICMS/ST.

Desta forma, a incongruência entre os cálculos das distribuidoras e das Fazenda Estaduais gera uma série de autuações pela complementação do imposto estadual, acrescido de juros, multa e correção monetária.

Em linhas gerais, o ponto de insurgência cinge-se à alíquota aplicável, na medida que as autoridades fazendárias não deduzem o valor de ICMS próprio efetivamente destacado da nota fiscal e levada a débito na escrita fiscal das distribuidoras.

Só que, ao procederem desta forma, a fiscalização acaba por calcular de forma incorreta o valor do ICMS-ST, pois deduz indevidamente, do produto da base de cálculo do ICMS-ST multiplicado pela correspondente alíquota, o valor do ICMS próprio destacado nas operações.

Assim, os Fiscos acabam não aplicando ao cálculo o valor do ICMS destacado nas notas fiscais e, portanto, levado a débito na escrita fiscal do estabelecimento.

É relevante mencionar que na alíquota do ICMS próprio e, por conseguinte, do ICMS-ST, é aplicada a porcentagem relativa ao Fundo Estadual de Combate e Erradicação da Pobreza (FECP), o que, por consectário lógico, eleva a alíquota da operação.

Todavia, as autoridades fazendárias desconsideram o valor do ICMS efetivamente destacado pelas distribuidoras nas notas fiscais, bem como o referido adicional (FECP) para o cálculo do ICMS próprio.

Assim, o que se tem na prática é a exigência da diferença do valor do FECP, tendo em vista que a fiscalização entende que, ao calcular o ICMS/ST, deveria deduzir, do correspondente valor, a parcela equivalente ao ICMS próprio, tal como se este último fosse calculado a uma alíquota sem a inclusão do FECP.

Desta forma, as distribuidoras de combustíveis acabam sendo obrigadas a complementação do ICMS/ST, em virtude da desconsideração da alíquota total aplicável devida nas operações (ICMS + FECP).

Por essa razão, sendo certo que a legislação aplicável prevê o percentual relativo ao FECP no recolhimento do ICMS próprio, não pode a Fazenda Estadual desconsiderar tal montante para fins de cálculo do ICMS-ST. Caso assim fosse, estar-se-ia diante de uma grave violação aos princípios da legalidade tributária e da não-cumulatividade.

Neste viés, o princípio constitucional da não-cumulatividade relativo ao ICMS encontra-se previsto no artigo 155, II, §2º, da Constituição, segundo o imposto devido em certa operação será compensado com o montante cobrado nas operações seguintes.

Consequentemente, quando é apurado o ICMS-ST devido nas operações seguintes, é deduzido o valor do ICMS próprio pago na operação realizada. Só que as Fazendas Estaduais acabam reduzindo a parcela do ICMS próprio, eis que não utilizam o mesmo valor destacado nas notas fiscais e imputam tributação mais onerosa às distribuidoras.

Neste sentido, é pertinente destacar que o Código Tributário Nacional determina em seu artigo 3º que a cobrança de tributos é uma atividade administrativa vinculada, não podendo, portanto, a manutenção da exigência fiscal ser fundamentada sem base legal.

A administração pública não pode inovar de forma a exigir ou aumentar tributo em situações extraordinárias às previstas nas normas legais, eis que, se o fizer, violará o princípio da legalidade tributária, assim previsto no artigo 150, I, da Constituição.

À vista de todo o exposto, tem-se que a manutenção das exigências fiscais afronta diretamente dois dos maiores princípios do Direito Tributário - a não-cumulatividade e a legalidade tributária -, colocando em xeque a segurança jurídica que deve nortear as relações entre contribuinte-Estado, haja vista a conduta autoritária e desprovida de legalidade das Fazendas Públicas.

Diante das considerações acima, podemos concluir que as autuações fiscais exigindo a complementação do ICMS-ST são manifestamente indevidas, tendo em vista que o cálculo usado pelas Fazendas Estaduais e Distrital não encontra amparo na legislação tributária nem na Constituição.

Soma-se a isso o fato de que esta cobrança indevida de ICMS-ST fere frontalmente o princípio da legalidade tributária e a sistemática da não-cumulatividade, fazendo com que as distribuidoras suportem um encargo maior do que o previsto, o que pode até mesmo comprometer a viabilidade econômica das suas operações.

A tentativa de solução depende de um maior exercício do poder de autotutela dos Estados ou, ainda, de uma possível alteração legislativa para que a letra de lei seja clara o bastante a todos os interessados, de modo a cessarem autuações indevidas, conferindo, ao final, uma maior segurança jurídica para todo o setor.

Autores:

Janssen Murayama é sócio fundador de Murayama & Affonso Ferreira Advogados, graduado em Direito e Ciências Contábeis pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), pós-graduado em Direito Tributário, pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários (Ibet) e mestre em Direito Tributário pela Uerj, membro efetivo da Comissão de Direito Financeiro e Tributário do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB) e fundador e conselheiro do Grupo de Debates Tributários do Rio de Janeiro (GDT-Rio), além de autor e coordenador de livros e artigos científico-tributários e professor convidado do FGV Law Program.

Mariana de Oliveira Ferreira é advogada em Murayama & Affonso Ferreira Advogados, LL.M. em Direito Tributário pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) e extensão em Tributário pela Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro (Emerj).








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